O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou nesta quinta-feira (17), no Diário de Oficial da União, a Resolução CFM nº 2.156/2016, que estabelece os critérios para indicação de admissão ou de alta para pacientes em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), que devem ser observados pelos médicos intensivistas. A norma tem como meta contribuir para a melhora do fluxo de acolhimento de pacientes em situação de instabilidade clínica, frente a oferta insuficiente de leitos de UTI, especialmente na rede pública, e a má distribuições das unidades em todo o Brasil.
Com a publicação da Resolução CFM nº 2.156/2016, o Conselho Federal oferece aos médicos parâmetros baseados em critérios clínicos, científicos e éticos para que os profissionais possam lidar com o desafio cotidiano de oferecer o melhor atendimento à população. Segundo a norma, as admissões em UTI deverão levar em consideração os seguintes aspectos: diagnóstico e necessidades do paciente; priorização com base em evidências clínicas; serviços médicos disponíveis na instituição; disponibilidade de leitos; e potencial benefício para o paciente com as intervenções terapêuticas e prognóstico.
Critérios – Segundo o conselheiro federal por Minas Gerais e coordenador da Câmara Técnica de Medicina Intensiva do CFM, Hermann von Tiesenhausen, a necessidade de internação em UTI de pacientes pode, muitas vezes, superar a disponibilidade de leitos, sendo necessário, nesses casos, avaliar criteriosamente os casos com base nas evidências disponíveis de forma a permitir o melhor atendimento, afirmou. Pela Resolução CFM nº 2.156/2016, a admissão na UTI deve ser dada, prioritariamente, aos pacientes que necessitam de intervenções de suporte à vida, com alta probabilidade de recuperação e sem nenhuma limitação de suporte terapêutico.
Já os pacientes estáveis, que necessitam de monitorização intensiva contínua, por conta do alto risco de precisarem de intervenção imediata (com ou sem limitação de intervenção terapêutica), devem ser admitidos prioritariamente em unidades de cuidados intermediários (semi-intensivas).
Para pacientes com doença em fase de terminalidade ou sem possibilidade de recuperação, o CFM recomenda as unidades de cuidados paliativos como as mais adequadas. No entanto, mesmo nestas situações, o ingresso desses pacientes em uma UTI pode ser justificado em caráter excepcional, “considerando as peculiaridades do caso e condicionado ao critério do médico intensivista”.
A Resolução CFM nº 2.156/2016 orienta que todas as solicitações de vagas para unidade de tratamento intensivo (UTI) deverão ser justificadas e registradas no prontuário do paciente pelo médico solicitante. Ela também determina que o serviço de UTI de cada instituição hospitalar desenvolva protocolos internos, baseados em critérios de internação e alta da nova norma, que estejam de acordo com as necessidades específicas dos pacientes, levando em conta as limitações do hospital, tais como tamanho da UTI e capacidade de intervenções terapêuticas. Esses protocolos devem ser divulgados pelo diretor clínico ao corpo clínico do hospital e aos gestores do sistema de saúde.
Melhor acolhimento – De acordo com o 1º vice-presidente do CFM e correlator da Resolução CFM nº 2.156/2016, Mauro Luiz de Britto Ribeiro, pacientes com doença incurável e em fase terminal podem ser tratados com dignidade em outras unidades de internação, como enfermaria, apartamentos, unidades intermediárias e de unidades de cuidados paliativos. “É preciso ressaltar que, nestes casos, o médico deve oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal, sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, se for o caso”, explica.
Este entendimento é disciplinado no artigo 41 do Código de Ética Médica (Resolução CFM nº 1.931/09) e também na Resolução CFM nº 1.805/2006, que normatiza o atendimento a pacientes em fase terminal de doenças-crônicas. Esta última estabelece que, nesta etapa, é permitido ao médico, respeitando-se a vontade do paciente ou de seu representante legal, limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral.
Sobre a alta das unidades de terapia intensiva, Ribeiro esclarece que a Resolução CFM nº 2.156/2016 a permite desde que o paciente tenha seu quadro clínico controlado ou estabilizado. Paciente para o qual tenha se esgotado todo o arsenal terapêutico curativo ou restaurativo e que possa permanecer no ambiente hospitalar fora da UTI de maneira digna e, se possível, junto com sua família, também é condição para a alta.
A Resolução determina ainda que as decisões sobre admissão e alta em UTI devem ser feitas de forma explícita, sem discriminação por questões de religião, etnia, sexo, nacionalidade, cor, orientação sexual, idade, condição social, opinião política, deficiência, ou quaisquer outras formas de discriminação. A norma estabelece também que a admissão e a alta UTI são de atribuição e competência do médico intensivista, levando em consideração a indicação médica, e devem ser comunicadas à família ou responsável legal.
Paciente crítico – Os pacientes que necessitam de internação em UTI têm gravidade e possibilidade de recuperação variáveis, segundo o documento. O paciente crítico pode necessitar, por exemplo, de intervenção imediata, pois, na maioria das síndromes associadas a falências orgânicas, o prognóstico é tempo-dependente. “Alguns estudos evidenciaram que uma demora de quatro horas, ou mais, para a admissão de paciente grave na UTI pode contribuir para o aumento da mortalidade e maior tempo de permanência na UTI para recuperação”, aponta a justificativa da Resolução.
A norma do CFM descreve como paciente crítico aquele que apresenta instabilidade de um ou mais sistemas orgânicos, com risco de morte. Estes necessitam de suporte para disfunções, como ventilação mecânica, hemodiálise e suporte circulatório mecânico. Também são considerados críticos os pacientes sem nenhuma falência orgânica, mas com alto risco de descompensação e que, por esse motivo, necessitam de vigilância e monitoração contínuas.
Déficit e distribuição de leitos – Segundo os relatores da Resolução, a complexidade envolvida no tratamento intensivo também envolve a oferta e distribuição dos leitos UTI no território nacional. Segundo a Portaria do Ministério da Saúde nº 1.101/2002, deve existir de 2,5 a 3 leitos hospitalares para cada 1 mil habitantes. Já a oferta necessária de leitos de UTI deve ficar entre 4% e 10% do total de leitos hospitalares. O número ideal de leitos de UTI para cada grupo de 10 mil habitantes, deve ser de 1 a 3 unidades, o que é referendado pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB).
Em maio de 2016, no entanto, levantamento divulgado pelo CFM com base nas informações do próprio Ministério da Saúde identificou a existência de 40.960 leitos de UTI em todo o Brasil (razão de 1,86/10.000 habitantes). Desse total, 20.173 leitos estavam disponíveis ao Sistema Único de Saúde (SUS) para atender, no mínimo, 150 milhões de pessoas que dependem exclusivamente dessa rede (razão de 0,95/10.000 habitantes). Já a saúde suplementar ou privada contava com 20.787 leitos, para atender em torno de 50 milhões de pessoas (razão de 4,5/10.000 habitantes).
Outra constatação do CFM foi a má distribuição dos leitos públicos e privados, pois apenas 505 dos 5.570 municípios brasileiros possuíam pelo menos um leito de UTI. Além disso, dos 27 estados brasileiros, em 19 a razão de leitos de UTI por habitante na rede pública era inferior ao preconizado pelo próprio Ministério da Saúde. Isso ocorreu nas regiões Norte (exceto Rondônia), Nordeste (exceto Pernambuco e Sergipe) e Centro-Oeste, além dos estados do Rio de Janeiro e de Santa Catarina. No Acre, Roraima, Amapá e Maranhão o índice permanecia abaixo do ideal mesmo se considerados os leitos privados disponíveis nestes estados.
Fonte: Conselho Federal de Medicina