Relatório chama a atenção para as mutações do vírus. De acordo com médico especialista, tomar os remédios de forma errada é a maneira mais comum de criar uma versão resistente às drogas
Por Carolina Dantas, do G1
A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta para uma tendência crescente de resistência do vírus HIV às drogas disponíveis. O órgão divulgou nesta quinta-feira (20) um novo relatório com base em estudos. O texto destaca que em seis dos 11 países pesquisados na África, Ásia e América Latina mais de 10% das pessoas que começaram o tratamento antirretroviral tinham uma cepa do vírus resistente a medicamentos do mercado — veja quais são os países no gráfico abaixo.
O Brasil está na lista dos países com registro de resistência do vírus em novos pacientes, mas com índice menor que 10% — por enquanto, foram reportados 1.391 casos. A organização diz que o crescimento dessas taxas, mesmo que ainda lento, poderia minar o progresso internacional no tratamento e prevenção da doença.
A resistência do HIV é causada por uma mutação em sua estrutura genética, o que impede o bloqueio da replicação do vírus pelo remédio e o tratamento se torna ineficaz. Todos os medicamentos existentes contra vírus hoje correm o risco de se tornar parcialmente ou totalmente insuficientes contra a doença.
O médico especialista e pesquisador da Faculdade de Medicina da USP, Esper Kallas, diz que ter uma versão resistente do vírus é um alerta, mas não é motivo para pânico: o HIV pode se tornar resistente a um tipo de remédio, mas resta uma cartela grande disponível. Segundo ele, são mais de 20 tipos de pílulas contra a doença.
A Organização Mundial da Saúde classificou os tipos de resistência:
– Resistência adquirida quando mutações ocorrem em indivíduos que já recebem as drogas;
– Em pessoas que não tem histórico de ingestão de medicamentos do HIV e são infectadas por versões mais resistentes;
– Em pacientes com exposição prévia aos remédios, iniciando ou reiniciando o tratamento: mulheres expostas aos medicamentos para prevenção da transmissão do HIV de mãe para filho; pessoas que receberam Profilaxia Pré-Exposição, ou pessoas que reiniciaram o tratamento após interrupção.
Mas o que torna um tratamento ineficaz ou faz um vírus criar uma mutação contra alguns remédios? De acordo com a OMS e com Kallas, a resistência ao HIV se desenvolve quando as pessoas não seguem o tratamento prescrito – esquecem de tomar no dia e horário certo e/ou pulam etapas, como também acontece com o combate às bactérias. A organização diz que esses pacientes podem transmitir os vírus resistentes para outras pessoas.
“Quem é que passa um vírus resistente para outra pessoa? É uma pessoa que não está se tratando direito”, diz Kallas. Das 36,7 milhões de pessoas que convivem com o HIV em todo o mundo, 19,5 milhões têm acesso a algum tipo de terapia antirretroviral. Uma tendência crescente de resistência às drogas da doença pode levar a mais infecções e mortes. Um modelo matemático da OMS prevê um adicional de 135 mil óbitos e 105 mil novas infecções nos próximos cinco anos, caso novas medidas não sejam tomadas. O custo adicional pode chegar a US$ 650 milhões.
Foto: National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID)