Estudo da Esalq, em parceria da Unicamp, engloba dez espécies. Uma das próximas etapas é avaliar possíveis propriedades de cura
Por Rodrigo Pereira, G1 Piracicaba e Região
A raçá-boi, cambuití-cipó, murici vermelho, juquirioba… Já experimentou alguma delas? Embora sejam pouco conhecidas, estas e outras frutas nativas possuem um potencial de prevenção a doenças cardiovasculares, diabetes, mal de Alzheimer, Parkinson, tipos de câncer e até obesidade superior a outras espécies mais popularizadas.
Essa é a conclusão de um estudo desenvolvido no Programa de Pós-graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (USP/Esalq), em parceria com a Faculdade de Odontologia (FOP) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no qual foi avaliado o potencial antioxidante, anti-inflamatório e a composição fenólica de dez frutas nativas.
De autoria da engenheira de alimentos Jackeline Cintra Soares, o estudo tem orientação do professor Severino Matias de Alencar, do departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição, e a etapa de análise do poder preventivo durou três anos.
Além das já citadas, foram mapeadas o murici guassú, o morango silvestre, o cambuci, o jaracatiá-mamão, a fruta-do-sabiá e o cajá. As coletas ocorreram no Sítio Frutas Raras, localizado na cidade de Campina do Monte Alegre (SP), exceto o cajá, que foi coletado na Fazenda Gameleira, município de Montes Claros de Goiás (GO). As espécies são encontradas na mata atlântica e no cerrado.
Na prática, segundo Pedro Luiz Rosalen, professor titular da Faculdade de Farmacologia da Unicamp e um dos membros do grupo de estudos, elas são fontes de substâncias que controlam radicais livres que causam pequenas inflamações em vários lugares do organismo.
Valorização
“Nós queríamos algo inovador, algo que trouxesse um diferencial para a comunidade, a sociedade. Poder valorizar aquela fruta que tá no quintal e você não sabe nem o nome e nem o que é”, contou Jackeline. No trabalho, ela identificou até 21 compostos diferentes em uma fruta. “Qual tem atividade que está fazendo toda essa diferença eu ainda não sei. Vai ter de isolar. Pode ser que seja uma ou mais. São os passos seguintes da pesquisa”, revelou.
Para chegar ao resultado, a autora da pesquisa comparou as propriedades benéficas de frutas mais conhecidas, como uva, cereja e mirtilo, com as das suas dez escolhidas. “Então, as frutas [foco do estudo], principalmente a cambuití-cipó e o murici guassú, elas tiveram uma atividade [biológica] de sete a dez vezes superiores a essas frutas [mais popularizadas]”, detalhou.
Proteção, também, da fruta
Rosalen e Jackeline pontuaram que a natureza produz os compostos fenólicos para se defender de insetos e outros animais. Alencar cita a escolha de locais específicos para a produção de uma fruta mais popular, a uva, que também tem propriedades antioxidantes. “Nesse local [vinícola] tem um microclima que favorece o desenvolvimento de microfungos e outros microorganismos que a planta, para se defender, ela se protege se enriquecendo de compostos fenólicos”, relatou.
Atuação em curas
Agora, um dos próximos passos da pesquisa é isolar os compostos que estão diluídos nessas frutas, e uma vez isolados, será possível concentrar quantidades grandes deles, permitindo a atuação em situações agudas e até em processos de cura, por meio da produção de medicamentos. Esse novo processo deve durar ao menos cinco anos, aponta o orientador.
O orientador do estudo ressalta que a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que sejam consumidos 400 gramas de vegetais e frutas diariamente e que o consumo do brasileiro está bem abaixo disso.
Ameaçadas
Mas nem tudo é para ser comemorado. A degradação da natureza pelo homem coloca em risco o futuro dessas espécies antes mesmo que elas sejam conhecidas em larga escala e possam ajudar a melhorar a qualidade de vida das pessoas.
Foto: Rodrigo Pereira/G1