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Assistir a séries sem parar pode ser prejudicial à saúde

Consumo excessivo de telas pode afetar sistema cardiovascular, visão e sono

Por THE WASHINGTON POST

WASHINGTON | O que os americanos chamam de “binge-watching”, ou seja, assistir a muitos episódios de uma série de TV sem sair do sofá, agora se tornou mais comum e prático do que no passado. Novas séries são lançadas constantemente na Netflix e em outras plataformas e o espectador tem acesso a todas as temporadas e episódios de séries como “Game of Thrones” na hora que preferir.

Ainda que isso possa parecer glorioso para os fãs, causa um pouco de preocupação entre os especialistas em saúde.

Com tanto conteúdo disponível, e com longas sessões de TV se tornando a norma e substituindo o tempo dedicado a exercícios físicos, convívio social e sono, as potenciais implicações de saúde desse alto consumo televisivo estão se tornando mais óbvias.

As pesquisas sobre os efeitos de saúde do consumo excessivo de TV ainda estão na infância, mas alguns estudos já despertaram preocupações.

Segundo pesquisa de 2017 publicada pela revista Journal of Clinical Sleep Medicine, as pessoas que consomem TV em excesso reportam perda de qualidade de sono, fadiga aumentada e mais sintomas de insônia.

Pesquisadores da Universidade Estadual do Michigan identificaram uma conexão entre o consumo excessivo de telas e más escolhas de estilo de vida, tais como a opção por refeições não saudáveis e comportamentos sedentários.

Segundo especialistas, o consumo excessivo de séries e filmes pode afetar o sistema cardiovascular, a visão, as capacidades sociais e os padrões de sono —e tudo isso pode resultar em outros problemas.

Para Sophia Tolliver, médica de família no Centro Médico Wexner, Universidade Estadual do Ohio, a primeira preocupação é o quanto a pessoa pode se tornar sedentária.

“Estudos demonstram que ficar sentado por períodos longos demais pode elevar o risco de síndrome metabólica, o que por sua vez eleva o risco de doenças cardíacas, derrames e diabetes tipo 2”, diz Tolliver.

Em uma pesquisa de 2018, cientistas constataram que ficar sentado por muito tempo para assistir TV se assemelha ao comportamento sedentário prolongado em voos de longa duração, ou ao de pessoas com dificuldade de deslocamento por motivo de saúde. O comportamento pode elevar o risco de doenças como a trombose venosa profunda —um coágulo de sangue na perna que pode ser fatal caso se desloque pela corrente sanguínea e chegue ao coração ou pulmões.

No estudo, nem mesmo níveis de atividade física recomendados bastaram para reverter o risco de coágulos.

Tolliver também aponta que comer excessivamente e assistir TV ininterruptamente muitas vezes são atividades associadas, o que pode aumentar o risco de obesidade.

“Além disso, pesquisas demonstram que a maioria das pessoas costumam assistir TV demais quando estão sozinhas”, diz Tolliver. “Estudos conectaram falta de socialização a riscos elevados de doenças cardíacas e derrames, e isso sem considerar que uma redução no número de relacionamentos sociais significativos pode elevar a incidência de depressão e outras doenças de humor”.

Ronald Chervin, neurologista e diretor do centro de distúrbios do sono da Michigan Medicine, diz que assistir a múltiplos episódios de uma série na Netflix antes de dormir pode resultar em maior perda de sono, e não só na primeira noite.

“As telas emitem luz de espectro amplo, o que inclui luz azul”, diz Chervin. “Além de retardar a liberação de melatonina, o que mantém a pessoa acordada, a luz azul pode redefinir o ciclo de sono e alterar o padrão.”
A mudança de ciclo pode causar dificuldade para adormecer e para acordar e uma sensação generalizada de falta de sono.

“Também vemos pessoas que acordam no meio da noite e não conseguem retomar o sono, e por isso recomeçam a assistir TV”, diz Chervin. “Há um elemento de interação social desperta, ao assistir TV em grupo. As pessoas conversam, a adrenalina começa a fluir. Assistir TV no meio da noite só cimenta o hábito de estar acordado em horários em que a pessoa não deveria.”

O sono insuficiente é associado a diversos riscos de saúde, segundo Brad Lander, psicólogo na Universidade Estadual do Ohio. “Depressão, deficiência de memória, falta de coordenação, propensão a acidentes e problemas cardíacos”, diz.

Por fim, existe motivo para preocupação com o desgaste que as telas digitais causam na vista. Segundo o Vision Council, cerca de 80% dos americanos usam aparelhos digitais por mais de duas horas ao dia, e 59% deles reportam vista cansada, dores no pescoço e ombros, olhos ressecados, dores de cabeça e visão embaçada.

COMO CONSUMIR MELHOR O CONTEÚDO TELEVISIVO

Lander diz que não há nada de errado em uma ocasional sessão longa de TV. “A televisão tem efeitos psicológicos positivos. O problema está no exagero”.

A definição do que é um tempo excessivo diante do televisor varia muito de pessoa para pessoa —depende de pontos como genética, estado de espírito, idade e traços pessoais. Mesmo assim, há algumas maneiras de restringir o consumo excessivo e evitar os riscos à saúde.

Uma sessão longa de TV jamais deveria durar horas sem qualquer movimento. Caminhar um pouco a cada 30 minutos ou até assistir ao programa em pé por algum tempo são as dicas de Lander.

“Não tenha medo de usar o botão de pausa e fazer alguma outra coisa. Lave sua roupa, cozinhe, passeie com o cachorro”, diz Tolliver. Depois de uma longa sessão de TV, “caminhar ou correr são ótimas maneiras de entrar em movimento. O equilíbrio é o mais importante.”

E planeje os petiscos, recomenda Lander. Prepare comidinhas saudáveis, como pedaços de legumes ou pipoca estourada sem óleo.

Lander também sugere programar a TV para parar de funcionar depois de um tempo determinado, porque é difícil largar do sofá quando você está enfronhado em um programa ótimo. “Muitos televisores têm um recurso que permite programar o desligamento”.

Não exiba uma longa sequência de episódios logo antes de dormir, porque isso perturba o ciclo do sono. “A melhor rotina para o sono é evitar telas nas horas que precedem o sono; pelo menos uma ou duas horas longe delas”, recomendou Chervin. “Não se exponha à luz azul. Crie uma rotina confortável e relaxante, escove os dentes, coloque o pijama, leia um livro, vá se deitar em uma hora predefinida. É importante ter uma rotina. As pessoas presumem que sono perdido é fácil de recuperar, mas isso na verdade é muito difícil.

Por fim, se você vai passar horas na frente da TV, convide os amigos, em lugar de fazer da prática um hábito que gera isolamento e pode desgastar um relacionamento. “Faça disso uma atividade divertia com um amigo ou parceiro”, disse Tolliver. “Converse depois de cada episódio, comente sobre as coisas de que gostou e não gostou. Porque é difícil assistir a diversos episódios de “Game of Thrones” e “Shrill” sem pensar a respeito, não?

 

Foto: Divulgação

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