ImunizaSUS capacitará profissionais de saúde para vacinação
Iniciativa do Conasems tem apoio do Ministério da Saúde
Por Agência Brasil
Após a aprovação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) das vacinas da Fiocruz e do Instituto Butantan contra a covid-19 para uso emergencial em todo o território brasileiro, o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) lançou, na última quinta-feira (21), um programa para a capacitação de 94 mil profissionais de saúde que atuam diretamente nas ações de imunização nos municípios.
Batizado de ImunizaSUS, o programa é realizado em parceria com o Ministério da Saúde. Pela proposta, as Unidades Básicas de Saúde (UBS) serão adaptadas para funcionar como salas de aula para a capacitação dos profissionais na modalidade de Ensino à Distância (EaD). A previsão é que tanto as inscrições como o início das formações já ocorram a partir do início de fevereiro.
“A capacitação tem carga total de 180 horas e será ofertada no modelo de Ensino à Distância (EAD) com tutoria a partir de teleaulas transmitidas por satélite no Canal de Televisão Mais Conasems em horários pré-definidos nas UBS do país”, informou o Conasems.
Durante a cerimônia de lançamento do programa, o presidente do Conasems, Willames Ferreira, disse que a capacitação visa garantir a segurança tanto dos vacinadores quanto de quem vai se vacinar em uma das 47 mil UBS do país.
Ferreira lembrou que, além da formação a respeito da imunização contra a covid-19, as formações também abrangerão os outros 18 tipos de vacinas constantes no Programa Nacional de Imunização (PNI) do Sistema Único de Saúde (SUS).
“São 18 tipos de vacinas diferentes nas salas de vacinação, que também fazem diversas campanhas de vacinação sempre que somos provocados e instigados pelo sistema. Essas pessoas precisam de formação continuada a distancia”, disse. “Não vamos tirar ninguém do seu local de trabalho. As pessoas terão o processo formativo no seu local de trabalho e nada mais importante do que fazermos isso neste momento”, acrescentou.
O presidente do Conasems ressaltou a necessidade de, mesmo com a vacinação, se manter os protocolos de segurança sanitária e o distanciamento social. “Esses cuidados são necessários e devem ser seguidos diariamente. A vacina vai nos trazer uma tranquilidade grande para que possamos voltar à nossa normalidade em um curto espaço de tempo”, disse.
O programa também prevê a realização de pesquisa sobre a queda das taxas de cobertura vacinal nos últimos anos no país.
De acordo com o secretário executivo do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Jurandir Frutuoso, o programa parte da necessidade que o país tem de preparar as pessoas em um momento para atuar no combate à covid-19 e também fortalecer o Programa Nacional de Imunização.
“Essa responsabilidade que o SUS demonstra aqui é o que ele faz há 31 anos”, disse. “Embora não tendo as condições ideais para atuar ele [o SUS] é capaz de dar a resposta que dá, na dimensão e qualidade que dá porque há compromisso dos seus trabalhadores”, acrescentou.
As aulas também ficarão disponíveis em um ambiente virtual de aprendizagem (AVA) com conteúdo didático estruturado na linguagem web no formato de streaming para que o profissional tenha sempre à disposição os conteúdos da capacitação.
Para o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, a capacitação por meio do canal do Conasems, ao lado de outras iniciativas, como a interligação das UBS por meio da internet e a formação de agentes de saúde, vão dar mais capilaridade no combate à pandemia do novo coronavírus (covid-19).
“Há uns seis meses, o Conasems me trouxe a ideia de investirmos juntos na criação do canal Conasems/SUS. Ele [o canal] permite dar amplitude e capilaridade nas nossas ações”, disse. “Isso tudo junto é uma grande virada e isso é paralelo à vacina”, disse o ministro.
Novas doses
O ministro Pazuello disse que o país está no processo de recebimento de novas doses de vacinas contra a covid-19, tanto do laboratório AstraZeneca, responsável pelo desenvolvimento da vacina de Oxford em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz, quanto da CoronaVac, produzida pelo Instituto Butatan, em parceria com o laboratório Sinovac.
O ministro disse ainda que outros laboratórios também devem apresentar propostas para a utilização de imunizantes contra a covid-19 no país. Segundo o ministro, haverá uma avalanche de propostas, mas não citou quantas e quais, especificamente.
“Em janeiro, que é agora, e no começo de fevereiro, vai ser uma avalanche de laboratórios apresentando propostas, porque são 270 iniciativas no mundo produzindo vacinas, e a gente tem que estar com muita atenção e muito cuidado para colocar todas elas disponíveis o mais rápido possível, dentro da segurança, da eficácia e da nossa capacidade de colocar no local certo e na hora certa”, disse.
Veja a íntegra do lançamento:
Foto: Agência Brasil
Coronavírus: variante achada no Brasil poderia 'driblar' anticorpos e reinfectar quem já teve covid-19, diz pesquisador
Mais estudos são necessários para mensurar impacto de neutralização reduzida por anticorpos em nossa imunidade, diz Tulio de Oliveira
Por BBC
Um novo estudo de cientistas da África do Sul, ainda não revisado por pares, dá maior respaldo às evidências crescentes de que mutações compartilhadas pelas variantes do coronavírus detectadas no Brasil e na África do Sul podem não ser neutralizadas por anticorpos produzidos pelo organismo de quem já foi infectado pelo SARS-CoV-2, o vírus que causa a covid-19.
Isso abre a possibilidade de que pessoas que tiveram doença sejam infectadas novamente se expostas a essas variantes, diz à BBC News Brasil Tulio de Oliveira, responsável pelo estudo e diretor do laboratório Krisp na Escola de Medicina Nelson Mandela, na Universidade KwaZulu-Natal, em Durban, na África do Sul, onde vive desde 1997.
No entanto, mais estudos são necessários para mensurar o impacto dessa ‘neutralização reduzida’ dos anticorpos em nossa imunidade, ressalva ele.
Segundo Oliveira, testes em laboratório a partir do “vírus vivo” da cepa achada na África do Sul (501Y.V2) contendo mutações como E484K e N501Y — presentes também na variante do Brasil, mas não na do Reino Unido — mostraram “zero ou muito baixa neutralização” do patógeno pelos anticorpos.
Oliveira chefiou a equipe que descobriu a nova variante do coronavírus na África do Sul e compartilhou os dados com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o que, por sua vez, permitiu ao Reino Unido detectar a outra variante em seu território.
Acredita-se que todas essas variantes sejam mais transmissíveis do que a original, mas não se sabe, por enquanto, se mais letais. De todo modo, tende a haver mais mortes porque há muito mais casos.
Oliveira acrescenta que suas mais recentes descobertas também levantam “uma grande questão” sobre a eficácia das vacinas.
“Se os resultados do laboratório mostram que essa variante é menos neutralizada pelos anticorpos, isso terá algum efeito na eficácia das vacinas?”, questiona Oliveira.
“No momento, presumimos que a eficácia das vacinas não será comprometida. E se for, será pouco (comprometida). Porque as vacinas desencadeiam uma resposta imunológica alta, produzindo muitos anticorpos, por exemplo. Mas ainda é uma questão a ser respondida”, acrescenta.
Ele reforça que esses primeiros resultados não podem servir de “desculpa” para interromper os programas de vacinação em todo o mundo.
“Esse vírus nos mostrou que se deixarmos ele circular livremente por muito tempo, se adaptará melhor à transmissão e, potencialmente, escapar de ser neutralizado pelo sistema imunológico”.
“Temos que aumentar com urgência as taxas de vacinação e a resposta da saúde pública para que possamos controlar as taxas de infecção o mais rápido possível e reduzir as taxas de mortalidade por essas variantes altamente infecciosas”, acrescenta.
‘Vírus vivo’
Nos últimos dias, vários estudos indicaram que mutações “escapariam” da ação de anticorpos neutralizantes produzidos pelo corpo contra o SARS-CoV-2.
No entanto, Oliveira e sua equipe foram além e usaram o “vírus vivo” pela primeira vez em testes de laboratório em oposição ao chamado pseudovírus — uma “técnica mais avançada”, explica Oliveira, usando todas as mutações incluídas no vírus, e, então, fizeram comparações usando a variante anterior da covid-19.
“Os resultados mostram que mais de 50% do plasma convalescente (com anticorpos) exposto ao vírus não obteve neutralização. E os outros 50% obtiveram neutralização de baixo nível. Quase metade dos indivíduos com quase nenhuma neutralização parecia nunca ter visto o vírus antes”, explica Oliveira.
“O melhor modelo para testar isso é com o vírus vivo, você pega o vírus inteiro, você infecta as células e faz crescer no laboratório, é uma técnica mais avançada e depois você o re-expõe ao plasma convalescente, então você considera o taxa de crescimento do vírus e como ele é neutralizado”.
“Concluímos que houve uma neutralização do vírus muito menor, tão menor que, em tese, são necessários cerca de 10 a 15 vezes mais anticorpos para neutralizar o mesmo vírus em comparação com a variante anterior”, acrescenta Oliveira.
Segundo ele, “não são boas notícias. Esperávamos que aqueles que já tiveram a covid-19 não fossem infectados novamente. Isso abre as portas para o vírus com essas mutações reinfectar as pessoas. É uma das principais questões a serem respondidas nas próximas semanas”.
Oliveira assinala que mais estudos são necessários para determinar o impacto disso em nossa imunidade, pois nossa resposta imunológica não depende apenas dos anticorpos, mas também das chamadas células T, que atuam em conjunto com eles.
Jesse Bloom, professor-associado de Ciências do Genoma e Microbiologia da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, concorda.
“É definitivamente claro que as mutações no RBD (domínio de ligação ao receptor), especialmente a mutação E484K encontrada na linhagem 501Y.V2, reduzem a neutralização do anticorpo. No entanto, atualmente não está claro o quanto essa neutralização reduzida diminui a eficácia protetora da imunidade”, diz ele por e-mail à BBC News Brasil. O RBD é uma pequena porção da proteína S do SARS-CoV-2, chave para a ligação do vírus às células humanas e sua infecção.
Cientistas acreditam que essa “neutralização reduzida” pode ser uma das razões pelas quais algumas partes da África do Sul e da cidade de Manaus, no Amazonas, muito atingidas durante o primeiro pico da pandemia, foram de novo amplamente afetadas pela segunda onda — levantando dúvidas sobre a chamada “imunidade de rebanho” que alguns especialistas já haviam dito ter sido alcançada nessas áreas por meio de infecções em massa.
A imunidade de rebanho ocorre quando uma parcela grande o suficiente da população desenvolve uma defesa imunológica contra um patógeno. Nesse cenário, a doença não consegue se espalhar porque a maioria das pessoas é imune e ela passa a ter grande dificuldade para encontrar alguém suscetível. Esse patamar é atingido pela vacinação em massa, e não por infecções em massa.
“Naturalmente, seria de se esperar que essas regiões não fossem muito afetadas pela segunda onda da pandemia, e não é o que vimos”, diz Oliveira.
“Ainda temos que investigar se essa nova variante menos neutralizada por anticorpos em laboratório causará maiores taxas de infecção”, acrescenta.
“O objetivo da vacina não é parar a transmissão; é fazer com que as pessoas que são infectadas não desenvolvam sintomas muito sérios. O principal objetivo é salvar vidas. E não só a vacina, mas a resposta da saúde pública, de testagem e rastreamento e isolamento e medidas de distanciamento social para tentar diminuir o número de infectados”, conclui.
Foto: EPA
Café diminui tamanho da barriga e reduz apetite, aponta estudo
Pesquisa britânica publicada no British Journal of Nutrition concluiu que café ajuda a emagrecer quando consumido de três a quatro vezes por dia. Leia mais!
Por Isto É
Por mais que ele seja considerado muitas vezes um vilão para a saúde, a ciência recentemente saiu em sua defesa. Isso porque um estudo comprovou que, além de ser saudável, o café ajuda a emagrecer, reduz o apetite e aumenta a energia do corpo.
As conclusões foram publicadas pelo British Journal of Nutrition após pesquisadores notarem que a circunferência da cintura e nível de apetite das pessoas que participaram do estudo diminuiu após o experimento.
Segundo eles, três e quatro xícaras de café por dia são o suficiente para garantir os benefícios, além de contribuir para a prevenção de doenças coronárias, doença de Parkinson e diabetes tipo 2. “O tratamento ainda mostrou uma redução significativa da resistência à insulina e do aumento da glicose no sangue”, aponta um trecho da publicação.
Vale ressaltar que o café só oferece estes benefícios quando consumido puro, sem adição de açúcar ou cremes. Além disso, mulheres grávidas devem evitá-lo, pois a cafeína aumenta o risco de partos prematuros, segundo informações da revista britânica Public Health Nutrition.
Foto: Divulgação
Cientistas desenvolvem técnica que permite monitorar evolução de tumores
Os resultados iniciais em experimentos com ratos foram apresentados na última edição da revista americana Science
Por Diário de Pernambuco
Um dos maiores problemas enfrentados no combate ao câncer é a metástase — a rápida propagação das células doentes no organismo humano —, que dificulta o tratamento da enfermidade. Em busca de formas de evitar a evolução acelerada de tumores, pesquisadores americanos resolveram monitorar esse processo em tempo real. Para realizar a difícil tarefa, utilizaram a tecnologia CRISPR-Cas9, que consegue alterar o DNA com precisão, e análises computacionais minuciosas. Os resultados iniciais em experimentos com ratos foram apresentados na última edição da revista americana Science.
Quando o câncer está presente em apenas uma região do corpo, geralmente é possível eliminá-lo com cirurgia e terapias medicamentosas, mas esses casos não costumam ser comuns. O diagnóstico tardio da doença também faz com que a metástase seja descoberta tardiamente, o que aumenta as chances de óbito. “Esses eventos são normalmente impossíveis de monitorar em tempo real, sendo vistos pelos médicos apenas quando estão já bem estabelecidos”, relata, em comunicado, Jonathan Weissman, um dos autores da pesquisa e membro do Instituto Whitehead de Pesquisas, pertencente ao Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos.
Para mudar esse cenário, Weissman e sua equipe resolveram usar como alvos de rastreamento da metástase mutações presentes nos tumores e identificadas em estudos anteriores. “Esse método, no entanto, é limitado, pois depende da existência de mutações ou outros marcadores de ocorrência natural que sejam suficientes para serem monitorados”, enfatizam os autores do artigo.
Em vez de esperar que uma linhagem de câncer contivesse marcadores específicos relacionados à propagação do tumor, os pesquisadores decidiram adicionar alvos desenvolvidos em laboratório. “Basicamente, a ideia é projetar uma célula que tenha uma espécie de arranhão genômico de DNA, ou seja, uma mutação comum em tumores, utilizando a técnica CRISPR-Cas9”, explica Weissman.
A equipe projetou células cancerígenas humanas usando a técnica e, depois, as utilizou em ratos, com o objetivo de gerar um tumor de pulmão nas cobaias — esse câncer geralmente apresenta metástase agressiva em humanos. Por meio de um monitoramento computacional avançado, os cientistas conseguiram acompanhar a evolução das células no organismo dos animais. Com as informações, criaram um mapa detalhado de divisões celulares.
Segundo os investigadores, a técnica permitiu construir uma árvore genealógica do tumor. Ao examinar os ramos, eles conseguiram rastrear a linhagem de cada célula para descobrir quando elas se tornaram nocivas e começaram a se espalhar para o resto do corpo. “Com esse método, você pode fazer perguntas como ‘Com que frequência esse tumor está metastatizante? De onde vêm as metástases? Para onde vão?’”, ilustra Weissman. “Ao ser capaz de acompanhar a história do tumor in vivo, você revela diferenças que seriam invisíveis de outra forma.”
Alvo de tratamento
O método revelou dados importantes relacionados à metástase. Um deles é que a evolução das células cancerosas se deu de cinco formas distintas, sendo que, na maioria das vezes, elas realizaram a mesma rota: “Partiram do pulmão esquerdo para outros tecidos, como o pulmão direito e o fígado”, detalham os autores. Também observou-se que o tecido linfático mediastinal, que fica entre os pulmões, parece ter um papel importante no processo de metástase. “Ele serve como um ponto de passagem que conecta as células cancerosas a todo esse terreno fértil que elas podem colonizar”, relata Jeffrey Quinn, também autor do estudo e pesquisador do MIT.
Segundo os cientistas, a descoberta de “centros de metástase” pode ser extremamente útil para as terapias oncológicas. “Se durante o tratamento contra o câncer você focar nesses locais, poderá prevenir ou retardar a metástase”, explica Weissman.
A equipe espera ir além da observação das células e começar a prever o comportamento delas. “É como a mecânica newtoniana. Se você conhece a velocidade, a posição e todas as forças que atuam sobre uma bola, pode descobrir para onde ela vai (…). É uma maneira inteiramente nova de olhar para o comportamento e a evolução de um tumor”, compara Weissman.
Patrícia Werlang Schorn, oncologista do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, destaca que o estudo explora uma área que é objeto de atenção de praticamente todos os especialistas da área. “Em câncer, o que mata é a metástase. Por isso, existe um esforço muito grande de quem estuda o tema em tentar achar os gatilhos desse processo, quais são as células e as proteínas relacionadas a essa disseminação. Se acharmos isso, conseguiremos criar um modelo de interrupção”, justifica.
A médica destaca que o estudo ainda é inicial e precisa de aprofundamento, mas pode fornecer importantes ferramentas que ajudem a aprimorar tratamentos. “Geralmente, identificamos a metástase no exame de imagem, mas, nesse estágio, ela já está estabelecida. Quem sabe daqui a alguns anos teremos como saber um pouco antes quando um tumor vai se expandir e usar um tratamento mais agressivo nesse momento para evitar que isso ocorra?”, cogita.
Uso ampliado
Werlang Schorn também acredita que a técnica proposta pelos americanos pode se tornar um método padrão para a área de pesquisa oncológica. “É um tipo de tecnologia cara e complicada, mas que pode ser aplicada em outros tipos de análises, já que tem se mostrado promissora, como nesse estudo, revelando informações importantes e que ainda não conhecíamos”, afirma.
Os pesquisadores do MIT planejam usar a nova tecnologia no estudo da evolução de outras enfermidades. “Eu acho que essa nossa área de pesquisa é um campo muito interessante, que deve crescer e pode ser um divisor de águas na área da biologia, já que estamos redefinindo o que é invisível e o que é visível”, afirma Matthew Jones, também autor do estudo.
Foto: ATS/Divulgação
Disparidades regionais agravam mortalidade por Covid no Brasil, diz estudo
Maior pesquisa já publicada mostra, entre os pacientes internados na UTI, a mortalidade geral no país foi de 55% e, no Norte, 79%
Por Folha de S.Paulo
A mortalidade de pacientes brasileiros internados com Covid-19 é mais alta em comparação com outros países e tem sido agravada pelas disparidades regionais de leitos e de recursos existentes no sistema de saúde.
A conclusão é de um estudo recém publicado na revista científica The Lancet Respiratory Medicine, que analisou 254.288 mil pacientes, com idade média de 60 aos, internados em hospitais públicos e privados nos seis primeiros meses da pandemia (entre fevereiro e agosto). É a maior pesquisa do gênero já publicada no mundo.
No Norte e no Centro-Oeste, por exemplo, 17% dos pacientes foram intubados fora da UTI em comparação com 8% no Sul e 13% no Sudeste.
“É um sinal de sobrecarga. Ou não tinha mais leito de UTI ou não conseguiram transferir o paciente. Quando precisa de ventilação invasiva, é um doente muito grave e é preciso ter um ambiente monitorado, uma equipe capacitada”, diz o médico intensivista e epidemiologista Otavio Ranzani, pesquisador da USP e um dos autores do estudo.
Das internações analisadas, 47% dos pacientes tinham idade inferior a 60 anos, 16% não apresentavam comorbidades e 72% receberam algum suporte respiratório (invasivo ou não invasivo) durante a internação. A pesquisa não diferenciou pacientes das redes pública e privada de saúde.
A mortalidade geral foi de 38% e aumentou conforme o avanço da idade (de 12% , entre 20 e 30 anos, para 66% para os acima de 80 anos) e das complicações. Nos doentes com menos de 60 anos, a taxa média de mortalidade ficou em 20%.
A proporção geral de mortes hospitalares foi maior entre pacientes analfabetos (63%), negros (43%) e indígenas (42%). A mortalidade também foi mais frequente em pacientes internados na UTI (59%) do que naqueles assistidos na enfermaria (29%). Entre os intubados, a mortalidade foi de 80% contra 24% entre os que receberam ventilação não invasiva.
As complicações mais associadas às mortes foram baixo nível de oxigênio no sangue (45%), dificuldade respiratória (43%) ou dispneia (41%).

O estudo
Entre fevereiro e agosto de 2020 analisou 254.288 pacientes hospitalizados em todo o país e registrados no Sinvep-Gripe
Fonte: https://www.thelancet.com/journals/lanres/article/PIIS2213-2600(20)30560-9/fulltext#tbl1

O estudo
Entre fevereiro e agosto de 2020 analisou 254.288 pacientes hospitalizados em todo o país e registrados no Sinvep-Gripe
Fonte: https://www.thelancet.com/journals/lanres/article/PIIS2213-2600(20)30560-9/fulltext#tbl1
As disparidades regionais também são marcantes. No Norte e no Nordeste, os índices de mortes hospitalares foram de 50% e 48%, enquanto no Centro-Oeste, no Sudeste e no Sul, de 35%, 34% e 31%, respectivamente.
Entre os pacientes internados na UTI, a mortalidade geral foi de 55%. Norte e Nordeste registraram 79% e 66%, respectivamente, enquanto Centro-Oeste, Sudeste e Sul, 51%, 49% e 53%.
Embora com diferentes metodologias, estudos em outros países apontam taxas de mortes menores. Na Alemanha, por exemplo, 17% dos pacientes receberam ventilação mecânica (não invasiva ou invasiva). A mortalidade hospitalar foi de 22% no geral e 5% para pacientes com menos de 60 anos. No Irã, a mortalidade geral foi de 24% e 42% entre aqueles acima de 65 anos.
“Na Inglaterra, a mortalidade no início da pandemia foi parecida com a nossa, mas os pacientes eram mais velhos e o momento era de pico. No Brasil, estamos sob pressão sempre”, diz Ranzani. Os pacientes analisados no estudo brasileiro são, em média, dez anos mais jovens do que os pesquisados nas séries europeias.
De acordo com a pesquisa, apesar do alto número absoluto de hospitais e leitos de UTI no Brasil em comparação com alguns países da Europa ocidental, a distribuição regional heterogênea desses recursos é uma barreira considerável para o acesso equitativo aos cuidados de saúde.
No início da pandemia, o Sudeste tinha cerca de duas vezes mais leitos de UTI por pessoa do que o Norte, por exemplo. Além disso, os leitos de UTI estavam concentrados nas capitais e regiões costeiras, o que gerou uma barreira adicional ao acesso aos serviços de saúde, especialmente após a expansão do Covid-19 para áreas do interior.
De acordo com Ranzani, apesar de o Norte e o Nordeste terem populações mais jovens, os desfechos foram piores, com mais doentes necessitando de internação em UTI e ventilação invasiva. Entre os pacientes intubados com menos de 60 anos, a mortalidade foi de 77% no Nordeste em comparação com 55% no Sul.
Segundo o estudo, muita atenção foi dedicada aos recursos disponíveis, como leitos de UTI e ventiladores, e pouca atenção foi dada ao treinamento de profissionais de saúde nas melhores evidências para apoiar a prática clínica ou a identificação precoce de casos graves ou manejo clínico de pacientes ventilados.
“O SUS é muito importante, os profissionais de saúde deram e continuam dando o máximo, mas o sistema não aguentou a sobrecarga. Por isso, temos que dimuinuir urgentemente a transmissão dos casos de Covid-19 fora dos hospitais”, diz Ranzani.
Os pesquisadores devem continuar as análises da mortalidade dos pacientes nesta segunda onda da pandemia. Vão avaliar, por exemplo, o impacto da expansão dos leitos emergenciais, da sobrecarga do sistema de saúde na região Sul e das novas variantes de coronavírus que já circulam no país.
INTENSIVISTAS RELATAM ESCASSEZ DE PROFISSIONAIS
Um outro estudo conduzido pela Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) com 999 intensivistas de todo o país mostra que a maior escassez de profissionais também foi observada no Norte e no Nordeste.
Metade dos médicos intensivistas e dos enfermeiros relatou falta de pessoal. “A saída para a escassez foi a contratação de profissionais não intensivistas ou profissionais que passaram a cuidar de mais de dez pacientes durante o plantão, sendo que dez é o máximo recomendado”, diz Suzana Lobo, presidente da Amib.
Segundo ela, a pesquisa também mostrou que essa situação está relacionada de forma significativa com o “burnout” do profissional. “Um número insuficiente de intensivistas também foi um indicador de má comunicação com familiares além de outros indicadores de boas práticas em UTI.”
A Amib, em parceria com a Abramed (Associação Brasileira de Medicina de Emergência), tem recomendado aos gestores de saúde que priorizem a vacinação dos profissionais especializados, capacitados, treinados e qualificados na assistência de tratamento intensivo.
“Esse capital humano é escasso e qualquer afastamento sobrecarrega muito os remanescentes. Essas ocorrências fazem com que a equipe tenha que frequentemente realizar longas jornadas de trabalho. Se essa estratégia for mantida, de forma contínua, implicará em riscos para a segurança dos pacientes e risco de exaustão e doenças ocupacionais para a equipe assistencial”, diz a nota.
A pandemia também vem causando impactos negativos em pacientes críticos com outras doenças, que sofrem com a sobrecarga do sistema de saúde, segundo Suzana.
“A taxa de mortalidade vinha caindo nas UTIs privadas e na públicas. Nossa força-tarefa conseguiu evitar um colapso da Covid, mas não assistiu de forma adequada os outros pacientes. Neste ano, a gente não pode deixar isso acontecer.”
Foto: Lalo de Almeida/Folhapress
Direito coletivo deve prevalecer no combate à pandemia, diz estudo
Artigo usa dados de 2002 a 2020 de nove países
Por Agência Brasil
O direito coletivo à saúde deve prevalecer sobre os direitos individuais no enfrentamento às pandemias, como a atual da covid-19, quando houver conflito entre eles. Esta é a conclusão de pesquisadores brasileiros no artigo intitulado Collision of Fundamental Human Rights and the Right to Health Access During the Novel Coronavirus Pandemic (Colisão de direitos humanos fundamentais e o direito ao acesso à saúde durante a nova pandemia do coronavírus) , publicado na revista britânica Frontiers in Public Health.
O estudo reúne dados analisados de 2002 a 2020, com casos de surtos como a da Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars), em 2003, e a da Síndrome Respiratória do Médio Oriente (Mers), em 2012, além da atual pandemia de covid-19, e as medidas adotadas para proteção dos sistemas de saúde pública em Cingapura, Tunísia, China, Canadá, Reino Unido, Estados Unidos, Suíça, Portugal e Espanha.
Um dos autores do artigo, o professor Luiz Carlos de Abreu, do Departamento de Educação Integrada em Saúde do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), destacou que, em um contexto pandêmico, o direito à vida está acima de todos os direitos e acrescentou que os governos estão respaldados pelas constituições e legislações a tomar medidas restritivas para a preservação da vida.
“Quando falamos de colisão de direitos fundamentais, chegamos à constatação que os direitos da comunidade se sobrepõem aos direitos individuais,”, disse.
O advogado Paulo André Messetti, doutorando na Faculdade de Medicina do ABC (São Paulo), também autor do artigo, afirmou que a saúde pública foi priorizada nos contextos de pandemia nos países analisados e que os governos têm a possibilidade de tomar medidas contrárias ao interesse individual, como a liberdade de ir e vir.
“Não existe direito humano fundamental que seja absoluto, sendo assim, não podem ser encarados como átomos que não se chocam com os demais direitos. A liberdade de ir e vir não se dá em qualquer situação, não é absoluto”, exemplificou.
Messetti lembrou que, apesar de ser regra o direito coletivo à saúde prevalecer sobre o direito individual, há exceções em que o direito do indivíduo pode favorecer a coletividade. Ele deu o exemplo do profissional de saúde com comorbidades, que mora com pessoas idosas, que se recusa a atender pacientes infectados pelo novo coronavírus. “Nesse caso, o direito individual se sobrepõe ao coletivo porque não vai expor uma população vulnerável a mais contaminação”.
O advogado também citou o exemplo de um preso com comorbidades que, se infectado pelo coronavírus, vá para prisão domiciliar com o uso de tornozeleira eletrônica. “O direito de liberdade do preso está sendo colocado em prol da saúde coletiva para evitar a disseminação da doença”.
Também assinam o artigo os pesquisadores José Santos, Fernando Adami, Italla Maria Bezerra, Paula Christianne Maia e Elisa Tristan-Cheever.
Vacinação
O professor Abreu destacou que os estudos científicos apontam que 80% da população brasileira deve ser imunizada para diminuir a taxa de transmissão de casos de covid-19 para menos que 1 o que indicaria que a doença está sendo controlada. Para o sanitarista, a recusa de se tomar a vacina gera um problema de saúde pública.
Ele lembrou da importância da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para que os governos locais possam estabelecer medidas para vacinação compulsória da população contra a covid-19. Conforme o entendimento, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios podem estabelecer medidas legais pela obrigatoriedade, mas não podem determinar a vacinação forçada.
Com a decisão, nenhuma lei poderá prever que o cidadão seja levado à força para tomar a vacina, mas a eventual norma poderá prever a restrição de direitos pela falta de comprovação da vacinação, como deixar de receber um benefício, ser proibido de entrar em algum lugar ou ser impedido de realizar matrícula escolar na rede pública de ensino.
Os casos de covid-19 confirmados no país desde o início da pandemia no Brasil até a última quinta-feira (21) chegaram a 8.697.368.
Foto: Medicina S/A