A visão de um homem completamente cego foi parcialmente restaurada com o uso de proteínas sensíveis à luz encontradas em algas.
Por BBC News Brasil
O homem foi tratado com um tipo de terapia chamada optogenética, que usa proteínas para controlar as células da parte posterior do olho.
Ele soube que a terapia estava funcionando quando percebeu que podia ver as listras pintadas de uma faixa de pedestres.
O homem agora pode segurar e contar objetos sobre uma mesa, relata a Nature Medicine.
O paciente, cuja identidade não foi revelada, mora na Bretanha, norte da França, e foi tratado em Paris.
Ele foi diagnosticado com retinite pigmentosa, uma doença que leva à morte de células fotossensíveis na superfície da retina, há 40 anos.
A condição afeta mais de dois milhões de pessoas em todo o mundo e, embora a cegueira completa seja rara, o homem perdeu a visão nas últimas duas décadas.
Optogenética
Ele foi tratado com optogenética – um campo novo na medicina, mas que há muito tempo faz parte da pesquisa fundamental da neurociência.
A optogenética usa a luz para controlar precisamente a atividade das células cerebrais. Foi usada pelos cientistas para restaurar a capacidade dos olhos do paciente para detectar a luz.
A técnica é baseada em proteínas, produzidas em algas, chamadas rodopsinas de canal, que mudam seu comportamento em resposta à luz. Os micróbios os usam para se mover em direção à luz.
A primeira etapa do tratamento foi a terapia genética. As instruções genéticas para a produção das rodopsinas foram retiradas das algas e fornecidas às células das camadas profundas sobreviventes da retina, na parte posterior do olho.
Quando fossem atingidas pela luz, enviariam um sinal elétrico para o cérebro.
No entanto, elas responderiam apenas à luz âmbar, então o paciente usou um par de óculos com uma câmera de vídeo na frente e um projetor na parte de trás, para capturar o que estava acontecendo no mundo real e projetar uma versão no comprimento de onda certo na parte de trás do olho.
Demorou meses para que níveis suficientemente altos de rodopsinas se acumulassem no olho e para o cérebro essencialmente aprender uma nova língua para poder enxergar novamente.
‘Estávamos todos empolgados’
O primeiro sinal de que o tratamento estava funcionando foi quando o paciente estava passeando e, de repente, as faixas de uma faixa de pedestres apareceram.
“O paciente inicialmente estava um pouco frustrado porque demorou muito entre a injeção e o momento em que começou a ver algo”, disse o médico José-Alain Sahel, do Institute of Vision, em Paris.
“Mas quando ele começou a relatar espontaneamente que havia sido capaz de ver as listras brancas do outro lado da rua, estava muito animado. Estávamos todos empolgados.”
O homem não tem uma visão perfeita, mas a diferença entre nenhuma visão e até mesmo uma visão limitada pode mudar sua vida.
Para o professor Botond Roska, da Universidade de Basel, as descobertas fornecem “uma prova de que o uso da terapia optogenética para restaurar parcialmente a visão é possível”.
Existem várias outras abordagens sendo usadas para tentar restaurar a visão.
Uma inclui reparar os defeitos genéticos que causam doenças. A retinite pigmentosa, no entanto, pode ter mutações em mais de 71 genes diferentes, tornando isso um desafio maior.
Outra envolve conectar uma câmera a eletrodos implantados na parte posterior do olho.
A própria optogenética também está sendo pesquisada para condições como a doença de Parkinson, e para verificar se pode melhorar a recuperação de um derrame.
James Bainbridge, professor de estudos de retina na UCL (University College London) do Reino Unido, disse que o estudo foi de alta qualidade, mas em apenas um paciente.
“Esta tecnologia nova e estimulante pode ajudar as pessoas cuja visão está gravemente debilitada”, disse ele.
Foto: Getty Images