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Pesquisadora apresenta estratégia de vacina combinada contra Dengue e Zika

Por Medicina S/A

Uma nova abordagem de vacina pode oferecer proteção simultânea contra duas das maiores ameaças à saúde pública em regiões tropicais: Dengue e Zika. Essa estratégia foi apresentada pela cientista Sujan Shresta em um seminário no Institut Pasteur de São Paulo (IPSP), na cidade de São Paulo.

Essa abordagem se destaca porque estimula não apenas a produção de anticorpos, mas também a ativação de células T — um tipo de célula de defesa essencial para eliminar infecções e oferecer proteção de longa duração. Ao combinar esses dois aspectos do sistema imunológico, a vacina busca alcançar uma resposta mais robusta e duradoura do que as abordagens tradicionais baseadas apenas em anticorpos. “Por muito tempo, focamos apenas nos anticorpos neutralizantes. Agora sabemos que também precisamos das células T para garantir uma proteção mais completa e sustentável”, disse Sujan Shresta.

Realizada no Center for Vaccine Innovation do La Jolla Institute for Immunology (EUA), a pesquisa busca superar obstáculos históricos no controle dessas doenças, como a grande diversidade viral e a variabilidade individual das respostas imunológicas. O projeto também visa garantir que as vacinas sejam acessíveis a países historicamente excluídos das campanhas de imunização.

Ameaças persistentes – Entre as doenças infecciosas, Dengue e Zika continuam sendo as que mais impactam as regiões tropicais. Apesar de pertencerem à mesma família viral e compartilharem aproximadamente 65% de seus genes, os vírus interagem de maneiras diferentes com o sistema imunológico humano.

A Dengue provoca uma forte ativação imunológica, levando a uma inflamação intensa. O Zika, por outro lado, adota uma tática sorrateira: inibe a ativação das células dendríticas — essenciais para desencadear a resposta imune —, permitindo que o vírus se espalhe silenciosamente em áreas sensíveis como a placenta, o cérebro e os olhos. Essa diferença ajuda a explicar por que o Zika é especialmente perigoso durante a gravidez, podendo causar a síndrome congênita do Zika, incluindo microcefalia.

“Quando consideramos como o Zika interage com o sistema imunológico, fica claro por que ele consegue chegar ao cérebro e à placenta com tanta eficiência. Ele simplesmente desativa os alarmes iniciais que o corpo usaria para se defender”, destacou a pesquisadora.

Proteção cruzada – Durante sua apresentação, Sujan Shresta explicou em detalhes como a exposição prévia ao vírus da Dengue pode fornecer proteção contra a infecção por Zika. Estudos epidemiológicos já haviam observado que indivíduos previamente expostos à Dengue apresentavam menor risco de desenvolver complicações graves de Zika. No entanto, o mecanismo imunológico envolvido permanecia desconhecido.

O grupo de Sujan Shresta conseguiu elucidar melhor esse mecanismo, demonstrando, em estudos experimentais, que essa proteção não depende de anticorpos, mas sim da ativação de células T, especialmente as células CD8+, que reconhecem e eliminam células infectadas, e, em menor grau, das células CD4+. Estudos com modelos animais mostraram que, quando essas células T foram eliminadas, a proteção desapareceu, evidenciando que a memória imunológica mediada pelas células T é o principal fator de defesa cruzada entre Dengue e Zika.

“Descobrimos que o sistema imunológico tem uma memória funcional que pode ser reativada contra vírus relacionados, o que muda completamente a forma como pensamos sobre vacinas combinadas”, disse ela.

Estratégias inovadoras – Com base nessas descobertas, a equipe de Sujan Shresta está desenvolvendo vacinas de nova geração baseadas em RNA replicante encapsulado em nanopartículas lipídicas, com o objetivo de estimular simultaneamente a produção de anticorpos neutralizantes e a ativação de células T específicas (CD4+ e CD8+), para promover uma resposta imune mais completa e equilibrada.

O líder do grupo “Vigilância Genômica e Inovação em Vacinas” do IPSP, o pesquisador Rúbens Alves, contribuiu para essa etapa do projeto. Durante seu pós-doutorado no laboratório de Sujan Shresta, ele criou e projetou a plataforma de RNA auto-replicante, produziu as vacinas e gerou os resultados apresentados.

Nos testes pré-clínicos, a combinação de antígenos estruturais, como a proteína do envelope E, e antígenos não estruturais, como a proteína NS3, resultou em altos níveis de proteção contra ambos os vírus. Além disso, os pesquisadores estão explorando estratégias para prolongar a resposta imune, como o uso de moléculas que estimulam a memória imunológica, incluindo OX40 e 4-1BB, visando reduzir a necessidade de múltiplas doses de reforço.

A inspiração para essa abordagem vem das observações epidemiológicas e experimentais da proteção cruzada natural, que indicam que uma resposta equilibrada envolvendo anticorpos e células T pode oferecer uma resposta mais robusta e segura. “A natureza já nos mostrou que a exposição prévia a um vírus pode preparar o sistema imunológico para combater de forma eficaz o próximo. Nosso objetivo é mimetizar essa estratégia com vacinas seguras e acessíveis”, concluiu a pesquisadora.

Foto: Reprodução

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