Há cinco anos, Tatiana Erohin, 32, espera o resultado de uma denúncia feita contra um dos médicos que atendeu o seu filho João Pedro, então com 5 anos, em maio de 2010.O menino morreu de meningite. Segundo a mãe, houve negligência médica. Tatiana faz parte de um universo de pacientes e parentes que decidem registrar queixa em São Paulo. Por dia, 15 médicos são denunciados no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp). A maioria dos denunciados são clínicos gerais, cirurgiões plásticos e ginecologistas.
Por ano, em média, conta o presidente do Cremesp Bráulio Luna Filho, o órgão acumula 3.500 denúncias. Deste volume, 20% resultam em algum processo. E destes, 60% são condenados e recebem algum tipo de punição, que variam de uma advertência até a cassação.
– Todas as denúncias são investigadas. Nos últimos oito anos, das sindicâncias, de 15% a 20% viraram processo. Apesar do esforço do conselho, em orientar os profissionais, o número não diminui. Conversamos com os médicos, reiteramos a boa conduta da prática da Medicina – comenta Luna Filho. As queixas, explica o presidente, muitas vezes têm origem em um atendimento inadequado ou são estimuladas por alguém da família.
Segundo o conselho, um processo pode durar até cinco anos para ser encerrado. O aumento das denúncias, acredita Luna Filho, pode estar relacionado à elevada abertura de faculdades de medicina no país.
Prova aplicada pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), obrigatória há três anos para quem deseja obter o registro no Cremesp e atuar como médico, apontou que, dos 2.891 recém-formados no estado, 55% não atingiram o critério mínimo de conhecimento para atender pacientes. Entre os oriundos de faculdades particulares, 65% foram reprovados. No começo do ano, quando o resultado foi divulgado, preocupados com este cenário, os representantes do Cremesp anunciaram que estudariam medidas para exigir melhor preparo dos profissionais.
O Cremesp não informou quantos médicos tiveram o registro profissional cassado e quantos deixaram de atuar. Dados obtidos pelo O GLOBO apontam que dos nove médicos que tiveram o registro cassado entre 2010 e 2013 em São Paulo, dois perderam o registro por causa de denúncias de abuso sexual. Um deles é Roger Abdelmassih. Preso no ano passado, estava foragido da Justiça havia três anos e condenado por 52 estupros contra 39 mulheres.
‘MEU FILHO NÃO TEVE CHANCE’
Na noite desta segunda-feira, quase cinco anos depois da morte do filho mais velho, João Pedro Erohin Palácio, Tatiana compareceu à segunda audiência na sede do Cremesp, na região da Consoloção, na capital paulista. Ficou lado a lado de um dos médicos que, segundo ela, é o responsável pela morte do filho. Ela pouco pode falar na audiência. Era a vez do médico falar. E foi apenas isso. Nada de resultado.
No dia 3 de maio de 2010, o menino deu entrada em um hospital da Zona Sul, com febre e vômito. Recebeu dipirona e medicamento para vômito como tratamento. Morreu menos de dois dias depois de internação de meningite meningocócica. – Demoraram 16 horas para diagnóstico de meningite. Meu filho não teve chance, morreu de negligência médica – acusa Tatiana.
Ela conta que durante a audiência o médico entrou em contradição várias vezes, em relação aos horários de atendimento e condutas. Tatiana apresentou queixa contra os quatro médicos que atenderam João Pedro. Mas apenas uma denúncia virou processo. Ela acusa o órgão de corporativismo.
– Eles tentam fazer a gente desistir e convencer de que está fazendo algo errado. Eu perdi um filho, que era bem cuidado e amado. Eu seria capaz de contar o caso do meu filho 80 vezes, se fosse preciso, do mesmo modo, descrevendo tudo o que aconteceu. Mas o médico entrou em contradição várias vezes. Quero Justiça e vou até o fim. Ele vai ser responsável pela morte de mais quantas crianças? – questiona, indignada. Tatiana é mãe de outros dois meninos.
Procurado pelo O GLOBO, o Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp) não se manifestou.
Fonte: http://blogdobg.com.br/
Foto: Rodrigo Soldon, via Flickr