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9 estados ainda não enviaram os planos estaduais para programa de redução das filas de cirurgias eletivas

Somente 13 planos foram aprovados pelo Ministério da Saúde, uma das condições para liberar recursos aos estados para cirurgias eletivas.

Por Futuro da Saúde

Próximo a completar três meses do lançamento do Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas, Exames Complementares e Consultas Especializadas pelo Ministério da Saúde, 9 estados ainda não enviaram os planos estaduais para a efetivação da primeira etapa. A informação foi obtida pelo Futuro da Saúde por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e a pasta passou a divulgar os dados após a solicitação.

O envio dos planos estaduais é um dos critérios adotados para a adesão ao programa e para a transferência de recursos, na ordem de 200 milhões de reais. Com isso, cerca de 114 milhões de brasileiros, mais da metade da população do país (53,62%), ainda estão fora do programa. Eles residem nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Sergipe e São Paulo.

Até o momento, 13 estados já tiveram seus planos aprovados pelo Ministério da Saúde e 5 deles estão em análise. O tamanho da fila declarada pelos estados é de 289 mil cirurgias, e 47,7% delas serão contempladas pelo Programa. Os dados são atualizados conforme aprovação dos planos e foram disponibilizados até o dia 14 de abril.

As informações atualizadas apontam que a cirurgia de retirada da vesícula é o procedimento com maior demanda no programa, cerca de 66 mil pessoas. Em seguida estão a cirurgia de catarata, com 26 mil pacientes na fila, e a cirurgia para a retirada de hérnia, com 25 mil pessoas aguardando. A estimativa é que no Brasil haja uma fila entre 1 e 3 milhões de pessoas para cirurgias eletivas.

Futuro da Saúde procurou 4 estados para entender a dificuldade por trás da elaboração e envio dos planos estaduais. O Rio Grande do Sul afirma que já terminou seu plano e deve validá-lo ainda nesta semana, na Comissão Intergestora Bipartite (CIB), para pactuação entre municípios e estado. Cerca de 17 mil cirurgias devem ser realizadas através do programa.

São Paulo afirma, através de sua assessoria, que o plano está em elaboração, mas ressalta que não é uma “atribuição unicamente da Secretaria do Estado da Saúde”. O plano será pactuado com o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de São Paulo (Cosems-SP) e posteriormente enviado ao Ministério em seguida, mas não há uma previsão de quando isso será feito.

Já o Rio de Janeiro aponta que estuda junto ao Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Rio de Janeiro (Cosems-RJ) a adaptação do programa estadual de cirurgias eletivas, o OperaRJ, às regras do Programa Nacional. Já o estado de Pernambuco não respondeu aos questionamentos da redação.

Motivos para a demora

Existem alguns obstáculos possíveis a serem considerados no momento de analisar a demora dos estados em entregar os planos estaduais. O principal deles é a organização. Como a fila de cirurgias não é unificada, pode haver uma dificuldade em realizar esse reconhecimento sobre o número de pessoas e procedimentos necessários.

Não há uma padronização. Há regiões onde o estado tem sua própria fila, mas cada município também possui filas próprias e até os prestadores de serviços criam uma lista dos pacientes em espera daquela unidade. Por isso, o trabalho pode acabar tomando mais tempo e atrasar a efetivação do programa.

De acordo Marilia Louvison, vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e professora do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), apesar dessa dificuldade, é possível que através de uma força-tarefa os estados façam esses levantamentos rapidamente, com apoio das comissões intergestoras e dos municípios:

“Os estados têm que ter bons sistemas de regulação, bons sistemas de agendamento e ter este monitoramento das filas que estão prontas para operar. Quem estava pronto para operar antes da pandemia, se não foi revisto, já não se sabe mais quem está na fila, se ainda precisa e quer fazer a cirurgia. Tem que ser retomada a requalificação dessas filas”.

Da mesma forma, é possível que alguns estados tenham dificuldade em elencar os prestadores disponíveis para realizar os procedimentos. É preciso checar a disponibilidade, as condições de equipamento, profissionais, se os hospitais possuem capacidade para realizar alguns tipos diferentes de cirurgias, entre outros critérios. Regiões distantes dos grandes centros podem ter mais dificuldade nesse sentido. 

Os hospitais privados e filantrópicos mostraram, logo após o lançamento do programa, a disponibilidade e interesse em participar dos mutirões. É o caso, por exemplo, do plano estadual do Espírito Santo, que irá realizar procedimentos na Santa Casa de Iúna, localizada na cidade de mesmo nome a cerca de 184 quilômetros da capital Vitória, e no Hospital Evangélico Vila Velha, além de outros prestadores entre públicos e privados.

“Tem uma diversidade e desigualdade muito grande nos territórios. Pode ser que três meses seja tempo suficiente para quem estivesse organizado. Acredito que quem ainda não o fez não teve tempo suficiente e está em processo de organização. Talvez em mais 1 ou 2 meses seja necessário pensar em como o Governo Federal pode apoiar os estados com mais dificuldades”, defende a vice-presidente da Abrasco.

Demanda reprimida por cirurgias eletivas

As filas do SUS são um dos principais gargalos da saúde pública. Mesmo antes da pandemia havia uma demanda por investimentos em diversas áreas com o intuito de melhorar os prazos para a realização de cirurgias. Houve ainda uma redução dos recursos para o SUS nos últimos anos, que pode ter impactado tais serviços. Os mutirões sempre foram utilizados quando a situação se agravou, como forma paliativa de reduzir drasticamente o número de pacientes aguardando procedimentos.

Com a chegada da Covid-19, a situação ficou ainda pior. Serviços de investimentos precisaram ser realocados para conseguir lidar com a emergência em saúde, assim como houve adiamento de procedimentos considerados sem urgência para evitar a circulação do vírus entre a população. Contudo, a retomada gradual iniciou no começo de 2022.

“Neste momento não há a possibilidade de estados não terem filas por conta da fila. Talvez em momentos anteriores houvesse estados com filas gerenciadas. Fila sempre vai ter, mas com tempo de espera possíveis. Em alguns lugares as cirurgias oftalmológicas estavam mais bem gerenciadas, por exemplo”, explica Marilia.

Por outro lado, a professora da Faculdade de Saúde Pública da USP alerta que pode ocorrer uma situação mais complexa, em que por falta de consultas com especialistas e exames, não haja um grande número de pessoas com indicação para cirurgia. Por isso, é importante que os estados acompanhem os dados epidemiológicos e comparem com a sua realidade.

Nesses casos, Marilia sugere que inverta-se as etapas do programa nacional, que está começando pelas cirurgias eletivas, mas as próximas etapas previstas são exatamente exames e consultas eletivas. No entanto, também é preciso rastrear qual a demanda, para a partir daí tentar negociar com o Ministério da Saúde.

“A fila não é lugar de cuidado, é lugar de espera. Então, a pessoa tem que ser cuidada em algum lugar. Se estivesse sendo cuidada, esses lugares conheceriam essas pessoas e seria mais fácil mapear essas filas. Com a pandemia se perdeu muita gente do radar, principalmente os casos menos graves, e agora há mais dificuldade em retomar a fila”, conclui a professora.

Louvison defende que os mutirões não devem ser visto como uma política pública contínua e só são efetivos em momentos excepcionais, como este de cirurgias represadas. Para ela, apesar de sempre haver filas, é preciso que haja um tempo de espera digno, com o paciente sendo informado sobre a sua condição, que não traga complicações ou agravamentos, além do cuidado próximo e acompanhamento.

Mutirões estaduais

Com a alta demanda batendo à porta, alguns estados iniciaram por conta própria mutirões de cirurgias. É o caso do do Rio de Janeiro, que prepara o lançamento do OperaRJ, com um investimento de 100 milhões de reais. De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde (SES), o valor representa o dobro do previsto pelo Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas.

“O OperaRJ amplia a possibilidade de pagamento em até três vezes o valor da tabela do SUS para os municípios realizarem cirurgias eletivas. Além disso, a SES-RJ vem adotando, desde o ano passado, medidas a fim de reduzir o tempo de espera dos pacientes por cirurgias, incluindo as que são de competência municipal”, afirma a Secretaria em nota.

Por isso, a expectativa do estado é que haja uma adaptação dessa iniciativa às regras do programa do Governo Federal. Essa adaptação está em estudo junto ao Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Rio de Janeiro (Cosems-RJ), que promete enviar em breve para o Ministério da Saúde, ainda sem data definida.

“A gente tinha uma ausência do Governo Federal até então, e os estados foram organizando seus programas, até retomando alguns que existiam antes da pandemia e outros criados pelo agravamento da situação. Até porque os estados têm que colocar orçamento na saúde, vinculando 12% dos recursos”, explica a vice-presidente da Abrasco.

Marília aponta que esses programas estaduais são importantes, mas que os estados não devem recusar o financiamento do Governo Federal, já que em saúde há sempre uma discussão por falta de recursos. O ideal é que haja uma adequação ou realocação para outras áreas, mesmo que demande uma atuação mais forte de gestão.

É possível que haja também uma melhor distribuição dos recursos e serviços junto aos municípios ou ainda uma ampliação dos convênios com os prestadores de serviços. Na opinião de Louvison, aqueles hospitais que tiveram uma boa relação e bons resultados em mutirões regionais podem ampliar o escopo com incentivos provenientes de outras fontes, como este liberado pelo Governo Federal.

“Nós estamos produzindo um movimento federativo, recursos adicionais sempre serão bem-vindos e contribuirão com a possibilidade de avançar ainda mais. O Estado pode alocar seus recursos para outros fins, como para especialidades e exames, e reforçar o recurso disponibilizado pelo Governo Federal, mas pode dificultar porque vai precisar ter um rearranjo nas políticas estaduais, que não necessariamente eram articuladas e pactuadas com os municípios”, conclui a professora.

Foto: Reprodução/Futuro da Saúde

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