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Câncer de pulmão: o florescer de uma nova era de tratamentos

O tumor que mais mata no mundo atravessou uma longa seca de boas notícias. Mas surgem evidências do que promete ser uma chuva de tratamentos inovadores

 

Por Theo Ruprecht

do Portal Abril 

 

A primeira gota de esperança caiu em solo brasileiro no ano de 2011, quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou o remédio gefitinibe, da farmacêutica AstraZeneca, contra o câncer de pulmão avançado. Na época, era o único fármaco para a doença que não se enquadrava na tempestuosa quimioterapia – em vez de inundar o corpo com substâncias tóxicas, ele mira uma mutação no gene EGFR do tumor e preserva o tecido saudável.

Além da estrondosa redução nas reações adversas, o comprimido (sim, comprimido) oferece, em média, nove meses e meio de controle da enfermidade, contra pouco mais de seis meses da químio. Já em 2013 apareceu o erlotinibe, da Roche, com um mecanismo de ação similar. E, em 2016, desaguaram crizotinibe (Pfizer), nivolumabe (Brystol-Myers Squibb) e, recentemente, afatinibe (Boehringer Ingelheim). “O pulmão virou destaque na oncologia porque ganhamos boas medicações para ele. E muito mais está por vir”, diz o oncologista Hossein Borghaei, do Fox Chase Cancer Center, nos Estados Unidos

A primavera terapêutica desabrochou graças à maior compreensão dos tumores que se instalam nos órgãos da respiração. “Antes, nós os dividíamos em dois subtipos. Depois descobrimos subtipos dos subtipos”, conta o oncologista Luiz Henrique de Lima Araújo, do Instituto Nacional do Câncer (Inca), no Rio de Janeiro. “Agora notamos mutações específicas em cada um deles e estamos desenvolvendo armas para atacá-las”, completa.

Esses remédios se enquadram na chamada terapia-alvo. Para ter noção do potencial, o afatinibe, o mais jovem da turma – que também se volta contra o EGFR metamorfoseado -, chega a garantir um ano a mais de sobrevida em relação aos quimioterápicos. “É até impróprio aplicar a químio como primeira opção em gente com alterações no DNA tumoral capazes de serem alvejadas pelos novos medicamentos”, afirma o médico Antonio Carlos Buzaid, diretor do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes, em São Paulo. Porém, o defeito no EGFR surge em cerca de 20% dos brasileiros com câncer de pulmão.

Mesmo se somados aos 5% que exibem uma mutação no gene ALK – e que os torna candidatos para tomar o crizotinibe -, só um quarto dos pacientes se beneficiaria desses mísseis teleguiados. Cabe ressaltar que, em 2016, são estimados 28 220 novos casos desse tumor, que mata mais do que os de mama, próstata e colorretal juntos.

“A meta é reconhecer outras mutações para oferecer mais soluções”, diz o oncologista Stephen Stefani, do Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre. Mas a terapia-alvo não é o único ramo da oncologia que prenuncia tempos férteis.

 

A imunoterapia

Em vez de agredir o inimigo, a imunoterapia estimula os soldados do nosso corpo a atacá-lo. “Mas não esperávamos que a tática desse certo nos tumores de pulmão. Eis que surgem os estudos com nivolumabe mostrando grandes melhorias”, relata Borghaei. Liberado em 2016 no Brasil para cânceres avançados e previamente combatidos com quimioterapia, ele alcançou uma redução no risco de morte de 27% quando comparado a uma segunda rodada do tratamento-padrão.

Como funciona? A praga da doença só se espalha pelos pulmões porque acalma as tropas imunológicas. Entre outros estratagemas, ela faz isso a partir de uma molécula batizada de PDL-1, que se liga ao receptor PD-1 das células de defesa, inativando-as.

Já o nivolumabe gruda no PD-1, o que evita a interação amistosa. Azar do câncer, principalmente se considerarmos que, em 2017, outro imunoterápico com ação parecida deve desembocar no país: o pembrolizumabe, da MSD. Ele é o único aprovado nos Estados Unidos como arma inicial contra tumores avançados que germinam no pulmão e têm alta concentração de PDL-1.

Nessa situação, derruba em 40% o risco de morrer. “Há pacientes vivendo com câncer avançado faz mais de cinco anos. Isso era impensável”, contextualiza Araújo. A tendência é que brotem mais imunoterápicos em breve. “E o bom é que eles tendem a funcionar melhor em tabagistas, enquanto a terapia-alvo costuma ser mais eficaz em quem não fuma”, aponta Buzaid.

Por falar nesse fator de risco chamado cigarro, hoje é recomendado fazer uma tomografia de pulmão anual em pessoas entre 55 e 74 anos que tragaram mais de um maço por dia. O método diminui em 20% a mortalidade da doença, porque permite detectá-la quando ainda é possível podá-la com cirurgia.

“Mesmo assim, esse sujeito corre mais risco de falecer pelo problema do que um não fumante”, lembra Stefani. Associe esse diagnóstico aos remédios atuais, acrescente a queda na incidência do tabagismo e, então, se pergunte: o sertão um dia vai virar mar?

 

Foto: Shutterstock