fbpx

CENTRAL DE ATENDIMENTO 24H: 0800 61 3333

Açúcar e corrupção são maiores 'vilões' da medicina, alerta médico que defende respeito ao paciente

Aseem Malhotra é crítico de estudos científicos financiados por empresas e acredita que o açúcar deveria ser uma substância controlada

Por Tatiana Regadas, G1

Aseem Malhotra é um dos maiores críticos da medicina na atualidade. O cardiologista é o responsável pelo movimento Choosing Wisely, que é contra procedimentos médicos desnecessários e acredita no empoderamento dos pacientes.

“A nossa missão é promover conversas entre médicos e pacientes, ajudando os pacientes a escolher o cuidado que é suportado por evidências, livre de dano e realmente necessário”, diz o site do movimento.

Malhotra também é crítico do consumo de comidas ultraprocessadas e autor do livro “A dieta de Pioppi”, traduzido no Brasil como “Detox de 21 dias”.

No Brasil para o 1º Congresso Internacional de Low Carb, ele conversou com o G1 sobre o que diz ser uma epidemia de falta de informação na medicina e fez duras críticas ao financiamento de estudos cientificos feitos por empresas que têm interesse nos resultados, como as farmacêuticas.

A medicina também sofre com corrupção?
“O impacto da corrupção na medicina é devastador. Isso é um problema gigantesco e a raiz da crise de saúde. Precisa ser encarado. É preciso menos influência da indústria farmacêutica nas pesquisas. Um dos problemas é que aqueles com responsabilidade sobre a integridade científica, médicos, revistas científicas, organizações, compactuaram com a indústria por ganhos financeiros.”

Como combater as notícias falsas sobre saúde?
“O que precisamos fazer como profissionais de saúde é tornar a medicina boa novamente para que as pessoas confiem nas informações que são ditas. O jeito de fazer isso é retirar os conflitos de interesse e a influência da indústria nas pesquisas medicinais. Muitas das pesquisas publicadas não são confiáveis porque o financiamento é tendencioso. É financiado pelas empresas farmacêuticas cuja única obrigação é o lucro, e não fornecer o melhor tratamento possível.

Mas precisamos admitir ‘erramos’. A ciência evolui. Eu faço isso com meus pacientes o tempo todo, digo que sempre haverá incertezas, mas digo que vou fazer o melhor por eles baseado em todas as informações que temos. Quando todos os profissionais abraçarem essa ideia e comunicarem ao público, então as pessoas não precisarão recorrer às redes sociais para conselhos de saúde.”

Você diz que médicos também estão mal informados. Acredita que a medicina precisa se reavaliar?
“Temos o total colapso do sistema de saúde e uma epidemia de médicos mal informados e pacientes prejudicados. Isso se deve a uma série de fatores:

financiamento tendencioso de pesquisas: pesquisas são financiadas em busca de lucro e não porque beneficiará pacientes.
relatórios tendenciosos em jornais médicos
conflitos de interesses comerciais
uma má compreensão de estatísticas médicas entre os médicos e pacientes
Temos a solução para enfrentar isso, mas precisamos entender as raízes do problema antes. E uma vez que os médicos entenderem isso, nós poderemos -como profissão- fazer o que é melhor para nossos pacientes. Nenhum médico faz medicina para machucar seu paciente.”

Como pacientes e a comunidade científica podem lutar contra a influência comercial?
“A maior arma que temos contra essa falta de informação é a transparência. Nossos políticos, médicos, todos devem ser responsabilizados por decisões que eles tomam e influenciam o público, mas vai além disso. É sobre democracia. Se você está tomando decisões sobre sua saúde no dia a dia, baseado em informações tendenciosas dadas a você, isto vai contra o princípio básico da democracia.

Precisamos admitir que existe um problema no sistema. Tivemos a grande crise financeira de 2008 porque não tinha regulamentação para parar o excessos e manipulações das financeiras e das indústrias conectadas a elas. Agora, temos a mesma situação com a medicina e a bolha vai estourar logo. Do contrário nós, como sociedade, no mundo todo sofreremos. Não podemos permitir que isso continue.”

Como é o movimento Choosing Wisely (escolhendo com sabedoria, em tradução livre)?
“O principal sobre Choosing Wisely é empoderar pacientes para fazerem as perguntas corretas aos seus médicos. Curiosamente, quando os pacientes têm todas as informações sobre um procedimento ou um medicamento, a maioria escolhe não tomar ou não fazer o procedimento. O que o Choosing Wisely propõe para qualquer pessoa é que ela se pergunte: eu realmente preciso disso? O que acontece se eu não fizer? Existem outras opções? Se todos estão empoderados também faz o médico pensar um pouco mais sobre o que está fazendo. A boa notícia é que temos tantas informações e dados sobre o que significa ter uma vida saudável e estes componentes não envolvem tomar remédios.

O que você apontaria como o inimigo número 1 da saúde pública atualmente? E por quê?
“O maior contribuinte para doenças relacionadas à alimentação e obesidade, que é o maior fator para mortes e doenças crônicas no mundo atualmente, é o alto consumo de comidas ultraprocessadas. Quando você olha para o consumo de comidas deste tipo, a maior parte vem do consumo de comidas com muito açúcar e amido. Isso aumenta as chances para o fator de risco número um para ataques do coração que é a resistência a insulina. Mas também é o caminho para a diabetes tipo 2.

A melhor maneira de controlar isso é ter uma dieta livre de comidas ultraprocessadas, com particularmente pouco açúcar e poucos carboidratos processados.”

Você é muito crítico do açúcar. Acha que o açúcar deveria ser “colocado em julgamento”?
“Acho que a evidência sobre o açúcar é muito clara: primeira coisa a se dizer é que não existe uma necessidade biológica de açúcar. Não tem valor nutricional. É uma das únicas coisas que ingerimos que contribui para cáries, o que é um problema sério especialmente para crianças.

E agora está associado a diversas doenças metabólicas independentemente de calorias. Ou seja, mesmo que você se exercite e não esteja acima do peso ingerir muito açúcar vai te fazer mal. Existem quatro critérios agora que indicam que deveria ser regulamentado:

é excessivamente tóxico
é inevitável porque é adicionado em tantas comidas processadas
tem potencial para abuso
tem impacto negativo na sociedade
Devemos aprender com a história: a maior queda em mortes associadas a doenças cardiovasculares em décadas aconteceu por causa de regulamentação que focou na disponibilidade, acessibilidade e preço dos cigarros. ”

O que você considera uma dieta ideal para a maioria das pessoas?
“Acho que a coisa principal é evitar ao máximo comida ultraprocessada. No Reino Unido, metade da dieta alimentar é de comida ultraprocessada. O que eu recomendo na dieta Pioppi é uma base com muitos vegetais, não comer muitos vegetais amiláceos (considerado fontes de amido como milho, batata e mandioca), azeite de oliva, castanhas todos os dias, peixes oleosos, não consumir muito açúcar, evitar carboidratos processados, ingerir laticínios gordurosos e concentrar-se em uma boa nutrição. Se você fizer isso, melhorará em pouco tempo”.

Foto: Divulgação