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Estudo identifica como Sars-CoV-2 afeta irrigação sanguínea no cérebro

Enzima do coronavírus é capaz de “quebrar” proteína da qual dependem células endoteliais que compõem a membrana responsável por regular a irrigação cerebral

Por Revista Galileu

Um estudo inédito realizado por um grupo internacional de pesquisadores mostra como o novo coronavírus pode afetar a irrigação sanguínea no cérebro de pacientes com quadros graves de Covid-19, provocando a morte de células endoteliais vasculares. Os resultados foram publicados na revista científica Nature Neuroscience na última quinta-feira (21).

As células endoteliais vasculares cerebrais são componentes essenciais da chamada barreira hematoencefálica (BHE). Tal membrana permite que nutrientes essenciais para a atividade do cérebro se movam da corrente sanguínea para o sistema nervoso central, mas evita a passagem de micróbios e outros agentes tóxicos. A estrutura é, portanto, uma espécie de “defensora” do cerébro, já que é responsável pela irrigação adequada do órgão.

Mas a infecção grave pelo Sars-CoV-2 pode comprometer a função endotelial cerebral e, consequentemente, danificar a BHE. É o que os cientistas observaram ao analisar o córtex cerebral de pacientes que morreram em decorrência da Covid-19.

De acordo com o estudo, que contou com a participação de instituições como o Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica (INSERM, na sigla em francês) e o Instituto Pasteur de Lille, ambos na França, uma das principais enzimas do coronavírus — a Mpro — parece ser capaz de clivar (ou “cortar”) com alta eficiência uma proteína conhecida como “NEMO”. Presente nas células hospedeiras, a substância desempenha um papel-chave na sobrevivência das células endoteliais do cérebro. Sua clivagem, portanto, pode levar à morte dessas células.

Os cérebros analisados pelos pesquisadores pertenciam a corpos que foram autopsiados no Centro Universitário Médico Hamburg-Eppendorf e no Centro Médico Universitário Göttingen, na Alemanha. “Nossos dados sugerem que as células endoteliais do cérebro estão em risco desproporcional ao serem infectadas pelo Sars-CoV-2, devido a sua dependência da atividade NEMO para a sobrevivência”, concluem os autores no documento, também assinado por cientistas de instituições como o Departamento de Fisiologia da Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha, e o Instituto de Virologia Médica da Universidade de Frankfurt, na Alemanha.

Vasos-fantasmas

Como resultado da morte das células endoteliais cerebrais, os pesquisadores descobriram que o cérebro desses indivíduos apresentava uma série de vasos sanguíneos “vazios”, ou seja, sem células endoteliais — e, portanto, incapazes de realizar sua função. Esses resultados também foram observáveis em modelos pré-clínicos com camundongos e hamsters.

A presença desses “vasos sanguíneos fantasmas” não funcionais provocou uma diminuição do fluxo sanguíneo em algumas regiões do cérebro. Além disso, levou a uma ruptura temporária da BHB, provocando micro-hemorragias em áreas onde o sangue não deveria ter acesso livre. “Essa consciência da gravidade da infecção por Sars-CoV-2 e seus impactos no funcionamento adequado do cérebro é vital para permitir o melhor manejo possível dos pacientes infectados nos próximos anos”, conclui Vincent Prévot, Diretor de Pesquisa da INSERM, na França, e um dos autores do estudo, em comunidado.

Quadro reversível

Prévot se refere ao “melhor manejo possível” porque os resultados da investigação sugerem que inibidores da enzima Mpro do coronavírus têm potencial para prevenir essas complicações neurológicas associadas à Covid-19. Em camundongos, a morte generalizada de células endoteliais e o rompimento da BHB também foram evitados pela inibição da proteína R1PK1 ou deleção da Ripk3, que participam de atividades de morte celular. Inibidores dessa última, segundo o estudo, se encontram atualmente em testes clínicos.

Nas próximas etapas da pesquisa, os cientistas também pretendem analisar ​​os possíveis impactos de longo prazo em pacientes sobreviventes que tiveram a irrigação do cérebro diminuída durante alguma fase da infecção pelo coronavírus. O objetivo é investigar se o quadro poderia aumentar os riscos atrelados a distúrbios cognitivos ou neurodegenerativos e, a partir disso, estimar abordagens para reduzi-los.

Foto: Vincent Prévot/Inserm