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Diferentemente do Sars-CoV-2, vírus da varíola dos macacos é de DNA; entenda

Virologista explica que os vírus de RNA erram mais ao se replicar, criando mais mutações. Mas, por outro lado, os de DNA são mais estáveis e dificultam o surgimento de variantes

Por Revista Galileu

A varíola dos macacos está de repente no radar de todos, tendo passado de um punhado de casos fora da área onde é endêmico para mais de 1,6 mil casos em poucas semanas. Depois dos horrores que a Covid-19 trouxe, não é de surpreender que as pessoas estejam se perguntando se essa é outra pandemia em formação.

Apesar do nome, a varíola dos macacos é mais comumente encontrada em roedores e esquilos na África Ocidental e Central. Entretanto, a grande questão é, porque o vírus tem se espalhado em áreas onde não há reservatório animal natural? Ocorreu alguma mutação para se tornar mais eficiente em se espalhar de humano para humano?

Claro, estamos todos muito familiarizados com as variantes que o Sars-CoV-2 (o vírus que causa a Covid) gerou: alfa, beta, gama, delta, ômicron – sem mencionar as subvariantes. Então, o que impede um vírus que estava mais uma vez em casa, de se adaptar a novos ambientes ou de se espalhar melhor?

Uma diferença fundamental entre a varíola dos macacos e o coronavírus é que o primeiro é um vírus de DNA e o último um vírus de RNA. Resumidamente, os vírus de RNA cometem mais erros em seu código genético ao se replicar do que os vírus de DNA. Mais erros significam mais mutações e, portanto, mais chances de criar um novo design que seja melhor (mais “ajustado” no sentido darwiniano) do que a versão mais antiga que o gerou. É claro que muitas novas variantes são menos adaptadas ao seu ambiente e, fracassam sem que saibamos que elas existiam.

Os vírus de DNA, como a varíola dos macacos, são mais estáveis. Eles são capazes de “ler” seus genomas, então os erros, no caso as variantes, são mais frequentemente detectadas. Isso não significa que os vírus de DNA não possam mudar, mas que a probabilidade de qualquer alteração aconteça é menor do que com os vírus de RNA.

Os poxvírus que podem infectar humanos incluem a varíola (agora extinta na natureza graças às vacinas), varíola bovina, molusco contagioso e varicela dos macacos. Porém não inclui a varicela, que não é um vírus da varíola nem encontrado em galinhas. Eles são um grupo notavelmente estável de vírus que causam pústulas características. A varíola [que no inglês moderno se chama “pox”] vem do inglês antigo “pocc” que significa pústula, bolha ou úlcera.

Não são os sintomas habituais

Com qualquer vírus, particularmente aqueles que infectam apenas algumas pessoas a cada ano, é difícil conhecer a extensão total dos sintomas. Com o aumento de casos, começamos a ver o que chamaríamos de “apresentações atípicas ” desses microorganismos. Isso significa que as pessoas não estão exibindo as pústulas típicas que cobrem todo o corpo. Em vez disso, estamos vendo pequenas feridas nas áreas de contato com pessoas infectadas.

Estes sintomas incomuns provavelmente não se devem a alterações significativas no vírus, pois em estudos foi analisado que uma sequência genética do vírus de um paciente em Portugal não encontrou alterações significativas em comparação com surtos anteriores em 2018 e 2019. Em vez disso, a apresentação atípica é provavelmente porque estamos vendo muito mais infecções e, portanto, uma gama mais ampla de sintomas.

Uma outra razão possível para a mudança, é que a cepa da varíola dos macacos vinda do oeste da África — atualmente circulando em países não endêmicos — tende a produzir infecções mais leves do que a cepa da África Central.

Dado o que sabemos sobre outros vírus da varíola e a estabilidade dos vírus de DNA, é provável que o vírus da varíola dos macacos demore a mudar. Esta não é a única razão para um otimismo cauteloso. Também temos uma vacina com cerca de 85% de eficácia contra a varíola dos macacos. Independentemente de quantas pessoas estejam infectadas, a vacina ainda será eficaz, devido à baixa taxa de mutação em comparação com os vírus de RNA. Em outras palavras, é improvável que surjam variantes que possam “escapar” da vacina.

*Naomi Forrester-Soto é virologista e pesquisadora da Universidade de Keele, na Inglaterra. Este artigo foi originalmente publicado em inglês no site The Conversation.

Foto: Reprodução/Alamy Stock Photo