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SP tem 25% de cidades com teor inadequado de flúor na água

Um mapa completo da situação da fluoretação das águas nos municípios de São Paulo, apelidado de censo do flúor, deverá estar disponível para a sociedade a partir de maio. Resultados parciais da pesquisa, apresentados pelo CRO-SP durante o Ciosp, indicam inadequação do teor de flúor na água em 25% dos municípios. Os riscos à saúde da população, como o surgimento de cáries entre crianças de 0 a 12 anos e a fluorose são considerados efetivos pelos analistas. O trabalho é o mais amplo levantamento sobre a fluoretação das águas no Estado, assegurando abrangência total da análise nos 645 municípios. Até hoje, os dados disponíveis estavam restritos apenas aos 100 municípios com mais de 50 mil habitantes.

Sobre o assunto, o prof. Paulo Capel Narvai, dentista e especialista em saúde pública, faz depoimento exclusivo ao Jornal Odonto. Ele defende a posição da odontologia como uma instituição cuja responsabilidade em saúde pública vai muito além do núcleo de atividade do profissional, que é o paciente na cadeira odontológica.

Maior levantamento mundial

A pesquisa é uma parceria técnico-científica entre o CRO-SP, o Centro Colaborador do Ministério da Saúde em Vigilância da Saúde Bucal (Cecol-USP) e o Laboratório de Bioquímica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Unicamp (FOP-Unicamp).

O Cecol-USP responde pela metodologia empregada. A FOP-Unicamp, pelas análises e o CRO-SP participou com o envolvimento direto de mais de 50 fiscais. Em quase um ano de trabalho, os fiscais identificaram as localidades, suas fontes de abastecimento e os pontos para a coleta das amostras. “Pela abrangência geográfica e rigor técnico, o estudo é considerado o maior levantamento feito no mundo e poderá dar importante colaboração à adoção de políticas públicas na área de saúde, com ações mais eficazes, não apenas para São Paulo, mas também para o Brasil”, diz Cláudio Miyake, presidente do CRO-SP.

Números pela SS-250

Até o momento já foram coletadas amostras referentes a 640 municípios, ou 99,2% dos 645 municípios paulistas. Do total de 11.505 coletas, 2.772 delas já foram processadas. Os resultados do levantamento consideraram dois critérios importantes e, em ambos, a presença de teores baixos de flúor são destaques. No primeiro critério, foi considerado o padrão adotado pela Secretaria de Saúde do Estado, balizado pela resolução SS-250, publicada há 20 anos. Com esses parâmetros, aproximadamente um quarto da água analisada apresenta riscos à saúde. Essa resolução prevê que concentrações adequadas estão em uma faixa de 0.6 a 0.8. Abaixo ou acima dessa faixa, os teores são inadequados e podem favorecer o surgimento de cáries ou facilitar o caminho para a fluorose, respectivamente.

Das 2.772 análises, 462 amostras, ou 16,67%, apontam resultados abaixo do limite de 0.6 de concentração do flúor. Paralelamente, 219 amostras, ou 7,9%, estão acima da faixa estipulada pelo critério SS-250. E, com o porcentual adequado, na faixa entre 0.6 e 0.8, estão 2.091 amostras, que representam 75,43% das coletas.

Risco ou benefício

“Um levantamento dessa natureza, que indica caminhos concretos para o benefício da saúde da população, dentre muitos outros desdobramentos, compeliu o grupo a buscar mais do que um critério para a avaliação das análises”, explica o prof. Celso Zilbovicius, assessor do Cecol. Os pesquisadores decidiram fazer a apuração com base em um consenso técnico do Cecol, estabelecido em 2011, a partir de uma reflexão mais recente e considerado por diversos especialistas um modelo mais apropriado para esse tipo de avaliação.

Por esse critério, a classificação da dosagem do flúor na água não é apontada como adequada ou inadequada, como proposto pela SS-250, mas sim como risco ou benefício. “Você pode ter dosagens de flúor na água que beneficiam a questão da cárie ou que representem risco para a fluorose”, explica Zilbovicius. “O que os técnicos perceberam até o momento, por este modelo, também implica riscos para a saúde da população”, adverte.

Pelo consenso do Cecol, das 2.772 análises, 2.092 delas, 75,47%, estão concentradas na faixa entre 0.55 a 0.84, consideradas benéficas à saúde. Outras 252, 9,09%, estão na faixa entre 0.00 a 0.44, e 193, ou 6,96%, na faixa entre 0.45 e 0.54. Isso indica que mais de 16% da água analisada oferece riscos para a formação de cáries. Ainda por esse modelo, 185 amostras, 6,67%, têm concentração entre 0.85 a 1.14; 25, ou 0.90%, na faixa entre 1.15 a 1.44 e outras 25, 0.90%, acima de 1.45 ou mais. “Essas taxas que extrapolam a concentração média implicam em risco efetivo de fluorose”, avalia o assessor do Cecol.

O prof. Zilbovicius, ao apresentar as duas metodologias de análise, lembra que além de produzir dados e formar cidadãos, as universidades têm também a função de informar a sociedade.

Transparência e inclusão social

O trabalho de análise em São Paulo pôde ser ampliado graças à união de forças garantido por um termo de compromisso entre o CRO-SP, o Cecol e a Unicamp, assinado em 2013. “No levantamento anterior, que tornamos público no ano passado, cobrimos 105 municípios e os resultados negativos foram comunicados, por ofício do CRO – SP, a cada uma das cidades, uma vez que saúde da população e transparência sobre os índices de flúor nas águas são os objetivos iniciais do estudo”, explica. Na avaliação do CRO-SP os desdobramentos da iniciativa foram muito bons. “Fica evidente que esse tipo de análise deve acontecer de forma sistemática e ampliada, garantido que a população não corra riscos em virtude da má fluoretação das águas e que os resultados sejam públicos, servido de referência a administradores e governantes”, completa Cláudio Miyake.

Outro aspecto importante destacado pelo trabalho foi o papel democrático da adequada fluoretação, que beneficia todas as classes sociais, e colabora para o desenvolvimento de ações efetivas para a saúde da população. “Quanto mais baixo o IDH e menor a população de algumas cidades, os índices de saúde bucal tendem a se mostrar piores, de forma que o estudo é inclusivo e atinge algumas regiões que necessitam de mais atenção”, ressalta Miyake.

Além do céu da boca

A fluoretação da água é uma ação excelente, funciona, é segura, tem o melhor custo-benefício e é muito apropriada para estratégias de saúde. A opinião é do prof. Paulo Capel Narvai, dentista e especialista em saúde pública. Ele acredita que a polêmica que envolve a fluoretação ocorre por má informação. “O flúor é o décimo terceiro elemento mais abundante na natureza e temos contato com ele até sem saber” explica.

Embora existam vários municípios em São Paulo que ainda não adotam a fluoretação, a situação do Estado está em uma fase de aperfeiçoamento da vigilância sanitária para controle da qualidade da água. “Já demos grandes passos. Se São Paulo fosse um Estado norte-americano, estaria na quinta melhor posição em relação à fluoretação”, afirma Capel. “O desafio agora – destaca – é aplicar o conhecimento científico para desenvolver ações cada vez mais amplas e democráticas em benefício da sociedade.”

Isso abre possibilidade para outro trabalho do cirurgião-dentista, “que não se esgota no núcleo da atividade, que é o paciente na cadeira”, defende Capel. Para ele, o CD no seu dia a dia tem de se envolver em outras questões, utilizando a odontologia também como uma instituição ética, que se mostra reivindicativa, educadora e agindo de forma organizada em prol da saúde pública.

“O dentista tem credibilidade, é um formador de opinião, e precisa ter a percepção de que sua atuação pode ir muito além do céu da boca”, destaca o prof. Capel.

Fiscais nota 10, com louvor

Os especialistas envolvidos no censo da fluoretação em São Paulo foram unânimes em reconhecer, elogiar e agradecer a dedicação com que o trabalho de coleta de amostras foi realizado pelos 50 fiscais, todos CDs, do quadro do CRO-SP. Para sabermos um pouco sobre essa atividade essencial para o sucesso de uma pesquisa tão ampla e complexa, o Jornal Odonto entrevistou Fabrício de Jesus Chemello. Ele é fiscal da Delegacia Seccional de Ribeirão Preto, tem 39 anos, é casado, pai de um casal de gêmeos e trabalha no CRO-SP desde março de 2011.

Cada fiscal ficou responsável pelo levantamento nos municípios de sua seccional. “Mas, além dos nove municípios da nossa área de atuação, por causa da licença maternidade de uma colega em Franca e da saída de outro fiscal em Barretos, acabei trabalhando com 43 municípios”, conta Fabrício. Os pontos de coleta foram estipulados pelo Cecol a partir do mapa hidráulico de cada município, mas a quantidade de pontos em cada um deles variava. Em Ribeirão Preto, por exemplo, o abastecimento dos 700mil habitantes é feito por 103 poços artesianos e cada um deles é considerado uma unidade de tratamento. O Cecol selecionou 45 dessas unidades para coleta de amostras. Em cada unidade eram sempre realizadas três coletas. Em cada coleta deveriam ser retiradas duas amostras com intervalo mínimo de um mês. “Para concluir um ciclo de coleta, retirando uma amostra em cada um dos 45 pontos de Ribeirão, eram precisos 15 dias”, lembra Fabrício. Em municípios pequenos, como Santa Cruz da Esperança, com 3.500 habitantes, a coleta era feita em apenas dois pontos.

10 mil km percorridos

A rotina desse trabalho começava no contato telefônico com a empresa ou órgão municipal responsável pelo abastecimento do município, “Sempre fui muito bem atendido porque as pessoas se interessavam pelo trabalho e nos ajudavam”, conta o fiscal. Nas áreas urbanas, as coletas eram preferencialmente feitas em UBSs ou escolas públicas, onde o acesso dos fiscais era mais fácil. Quando havia pontos em áreas rurais de localização e acesso mais difíceis, Fabrício buscava ajuda dos habitantes locais.

Apesar de ter percorrido 10 mil quilômetros, entre abril do ano passado e janeiro deste ano, cobrindo uma área de quase 180 quilômetros de diâmetro, com três passagens em cada um dos 43 municípios, Fabrício considerou o trabalho “tranquilo e gratificante, pela importância que os resultados finais terão na melhoria da saúde de muitas pessoas”.

Por Maria Cláudia Flesch

Fonte: http://www.jornaldosite.com.br/