Noah Palermo de 5 anos morreu após cirurgia na Santa Casa de São Carlos. Fotos mostram médico, que deveria estar de plantão, em jogo da seleção.
A morte de Noah Alexandre Palermo na Santa Casa de São Carlos (SP), após uma cirurgia para a retirada do apêndice, completou 10 meses em meio a uma discussão. Marcos Palermo, pai da criança, postou nesta semana, no Facebook, fotos que mostram o médico Luciano Barboza Sampaio torcendo pelo Brasil no amistoso contra a Sérvia, em 6 de junho, dia em que Noah foi para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI). “Por que ele não veio? Ele via o jogo enquanto meu filho morria. Isso não tem cabimento”, desabafou o pai.
O caso está sendo investigado pela Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) e a escala entregue à Polícia Civil aponta que o especialista estava de plantão no dia 6. O inquérito que apura se houve responsabilidade pela morte da criança, contudo, ainda não foi finalizado. Apesar disso, o pai apresentou documentos da Secretaria da Saúde e da Comissão de Ética da Santa Casa que apontam indícios de “imperícia”, “negligência” e “infrações éticas”.
“Não fomos notificados sobre as fotos. Estamos acompanhando e aguardando a conclusão do inquérito policial. O laudo apontou que ele não tem culpa”, disse o advogado Augusto Fauvel, que representa o cirurgião pediátrico. Ao Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), o médico informou que saiu do hospital na data mencionada por motivos particulares.
Investigação
A delegada Denise Gobbi Szakal afirmou ao G1 que o primeiro laudo sobre o caso foi inconclusivo e que foram solicitados por duas vezes pareceres complementares. “Mais de 50 pessoas foram ouvidas e estamos aguardando algumas provas para ouvir o médico e dar um desfecho à investigação”, contou. “Os pais ligam quase todos os dias. Sei a dor que estão sentindo”, completou.
Ao Jornal da EPTV, ela informou ainda que recebeu a programação do plantão dos especialistas da Santa Casa. “O cirurgião pediátrico de plantão no dia dos fatos realmente era o médico que estava escalado, o doutor Luciano”.
Em nota, a Santa Casa afirmou que em 16 de junho de 2014 enviou um pedido de abertura de sindicância ao Cremesp, regional Araraquara, para a apuração de responsabilidade da conduta médica. “Na época, toda a documentação do paciente Noah Alexandre Palermo, com os prontuários médicos, foi enviada ao Cremesp. A Mesa Administrativa da Santa Casa aguarda a decisão do Cremesp para se posicionar”, informou a delegada.
Processo
Documentos fornecidos pelo pai mostram que a auditoria da Secretaria Municipal de Saúde entendeu que há indícios de imperícia, negligência ou imperícia médica no acompanhamento de Noah. Em outro documento, a Comissão de Ética da Santa Casa encaminhou um parecer para o Conselho Regional de Medicina, onde informa que encontrou indícios de infrações éticas durante a condução do caso.
“A Comissão de Ética Médica da Santa Casa apontou para erro e mandou os documentos para o Cremesp. A apuração realizada pela ouvidoria da Prefeitura apontou negligência”, disse Marcos, que recebeu as imagens do jogo de um amigo e espera que elas sirvam de prova.
Ele criticou o fato de o Ministério Público não ter entrado com uma ação e a reportagem tentou conversar com o promotor para saber quais providências estão sendo tomadas, mas não conseguiu contato até a publicação.
“Quero que o médico seja julgado. Minha intenção não é financeira, quero é Justiça. E vamos entrar com ação contra a Santa Casa também, para que a equipe assuma que errou e que a administração recicle os funcionários. Vou até o fim não só por mim, mas por todos os pais”.
Segundo o advogado do médico, a promotoria só deve prosseguir se o inquérito for conclusivo e apontar omissão. “A perícia não apontou falha que tenha levado à morte. O laudo da Polícia Civil foi inconclusivo. O doutor Luciano atende normalmente, não foi provado nada contra ele”.
Revolta
Para Marcos, o médico cometeu dois erros: prescrever por telefone sem análise clínica e não deixar outro profissional de sobreaviso ao sair do hospital. Ele também defende que a equipe de enfermagem errou porque por várias vezes foi solicitada a presença de outro profissional.
“Erraram com meu filho. Eles têm direito de errar, mas não por omissão, por vistas grossas. Não é justo o que fizeram com ele. O Noah ficou agonizando por horas. Havia outros médicos no hospital. Por que não chamaram nenhum?”, questionou.
Marcos contou que, como as enfermeiras não conseguiam localizar o médico por telefone e não chamavam outro profissional, ele decidiu ir para a rua procurar alguém que pudesse intervir. “É uma área com muitas clínicas. Fui para a frente do hospital e achei o doutor Durval de Alcântara Filho, um santo. Ele me ouviu e foi ajudar o Noah, mas já era tarde. Ele entrou em coma e não voltou. Não consigo tirar da cabeça a imagem do meu filho morto”.
O pai disse que a família não se recuperou e que o sentimento de perda se mistura à indignação. “O descaso é muito grande. Mataram a família inteira. Tenho filho querendo trancar a faculdade, minha mulher com depressão profunda. Minha família está destruída”.
Entenda o caso
Noah Alexandre Palermo foi levado para a Santa Casa no dia 4 de junho de 2014 e diagnosticado com apendicite. Ele passou por cirurgia no dia seguinte, mas teve complicações e acordou com fortes dores abdominais na manhã do dia 6. O médico disse que era normal e receitou remédio para gases.
A criança não melhorou depois que o médico foi embora. “Eu pergunto por que meu filho não teve um atendimento digno? Por que esse descaso com meu filho? Por que meu filho ficou sem médico das 9h30 às 13h30? Ele morreu agonizando. Meu filho teve convulsões até chegar ao ponto de ter uma parada cardiorrespiratória. Ele morreu nos meus braços”, lamentou o pai em entrevista ao Jornal da EPTV do dia 18 de julho de 2014.
No prontuário, consta que o médico também receitou vitaminas. Na tarde do dia 6 ele sofreu uma parada cardíaca, foi para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e reanimado. Apesar disso, ele não resistiu e morreu no início da madrugada do dia 7. “Foi um complexo vitamínico, mais antibióticos. Isso foi prescrito pelo telefone. Assim que esse medicamento começou a entrar no meu filho ele teve convulsões até chegar ao ponto de ter uma parada cardiorrespiratória. Ele morreu nos meus braços”, lamentou na ocasião.
Fonte: http://g1.globo.com/
Foto: Mark Anderson, via Flickr