Segundo estudo, a trombectomia reduz a mortalidade e aumenta a independência das vítimas do AVC isquêmico, o que se traduziria em menos gastos
Por Saúde é Vital
Um tratamento relativamente novo contra o AVC isquêmico – aquele provocado pelo entupimento de um vaso sanguíneo no cérebro – pode chegar ao Sistema Único de Saúde (SUS) graças a um estudo brasileiro apresentado recentemente no Congresso Europeu de Acidente Vascular Cerebral. É a trombectomia, uma cirurgia que teve seu custo-benefício colocado à prova.
A técnica funciona como uma espécie de cateterismo, que ajuda a aspirar o coágulo para desobstruir o vaso sanguíneo no cérebro. Ela é aprovada desde 2015 em países como Estados Unidos, Canadá, Austrália, Holanda e Espanha. E, hoje, também é utilizada no Brasil, mas apenas nas clínicas particulares.
O estudo foi realizado de 2017 a 2019 em 12 centros de saúde nacionais e contou com a participação de 609 pacientes. Os neurologistas concluíram que esse método aumenta de 21% a 35% a independência funcional do indivíduo.
Além disso, foi constatada a redução de 16% na mortalidade ou no risco de dependência intensa. Isso tudo quando a trombectomia foi comparada a tratamentos medicamentosos usuais.
Segundo os autores, a investigação mostra também que a tática, apesar de custosa em um primeiro momento, representa um gasto pequeno para o governo diante do ganho de qualidade de vida e da possibilidade de manter uma pessoa ativa. Dessa forma, os custos para os cofres públicos do país seriam reduzidos no final das contas.
Como o AVC isquêmico é tratado atualmente
Na rede pública de saúde, a terapia padrão é a trombólise. A neurologista Sheila Martins, membro da Academia Brasileira de Neurologia (ABN) e vice-presidente da Organização Mundial de AVC, que apresentou a pesquisa no congresso europeu, conta que esse método foi descoberto em 1995.
“A trombólise é feita com um medicamento, o trombolítico, que é aplicado na veia. Ele viaja pela circulação até o coágulo que está entupindo o vaso sanguíneo do cérebro e tenta dissolvê-lo para retomar a circulação e a função daquela área”, explica Sheila.
De acordo com a neurologista, o trombolítico pode ser utilizado até quatro horas e meia depois do início dos sintomas. “Ele aumenta em 30% a chance de recuperação completa e ainda há a possibilidade de recuperação parcial melhor que de quem não é tratado”, complementa.
No entanto, para os quadros mais graves, que ocorrem quando a artéria entupida é muito grande, a trombólise não funciona tão bem. É aí que a trombectomia pode entrar em cena.
Até o momento, o método não está disponível na rede pública porque, apesar dos benefícios, ele necessita de uma estrutura hospitalar que nem todos os lugares do Brasil possuem. Sheila afirma que existem dificuldades para implementá-lo, já que a logística é complexa.
“É necessário tecnologia para realizar uma tomografia e uma angiotomografia [exame para verificar a circulação cerebral em tempo real], um médico neurorradiologista intervencionista, uma central de hemodinâmica e um anestesista disponível”, enumera a especialista.
Apesar das dificuldades, os dados do levantamento sugerem que esse investimento vale a pena. Ainda não há previsão sobre a implementação no SUS, mas os cientistas esperam que isso ocorra o mais rapidamente possível.
E um adendo final: a trombectomia não ajuda nos casos de AVC hemorrágico, em que o sangue extravasa dos vasos sanguíneos. Esse problema, popularmente chamado de derrame, é menos comum que o AVC isquêmico – mas, em geral, mais grave.
Ilustração: Francisco Martins/SAÚDE é Vital