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Cientistas investigam por que nossa temperatura corporal está caindo

Nas últimas duas décadas, houve um declínio de quase 1ºC na temperatura do corpo de adultos saudáveis em diferentes lugares do planeta. O motivo, contudo, permanece um enigma

Por Galileu

Há pelo menos dois séculos, o médico alemão Carl Wunderlich estabeleceu que a temperatura do corpo humano em condições normais é de 37ºC. Desde então, a medida passou a ser usada para, por exemplo, estabelecer a presença ou não de febre.

Mas, especialmente nos anos mais recentes, temperaturas corporais mais baixas vêm sendo registradas em adultos saudáveis. Em 2017, um estudo com 35 mil britânicos revelou que a temperatura média era de 36,6ºC. Dois anos depois, outro levantamento feito na Califórnia descobriu uma média ainda menor, de 36,38ºC.

Em 2020, pesquisadores da Universidade da Califórnia em Santa Barbara (UCSB) encontraram resultados semelhantes entre a população indígena tsimane, na Amazônia boliviana. Ao longo de 16 anos, como parte do Tsimane Health and Life History Project (Projeto de Saúde e História de Vida dos Tsimane, em tradução livre), a equipe estudou a população e identificou uma queda na temperatura corporal de 0,03ºC por ano — atualmente, a temperatura do corpo dos tsimane fica em torno de 36,5ºC. “Em menos de duas décadas vimos o mesmo nível de declínio observado nos EUA em aproximadamente dois séculos”, disse o diretor da pesquisa, Michael Gurven, professor de Antropologia na UCSB, em comunicado.

A equipe do estudo — publicado em outubro no periódico Sciences Advances — destacou que todos os cálculos foram ajustados para levar em conta a diminuição de infecções que provocam febre, e que o mesmo tipo de termômetro foi usado ao longo de praticamente todo o estudo, então a diminuição da temperatura não pode ser atribuída a isso. A pergunta central, então, passa a ser por que a temperatura corporal vem diminuindo com o tempo, tanto para os britânicos quanto para os norte-americanos e os tsimane.

“Embora a saúde tenha melhorado de forma generalizada nas últimas duas décadas, as infecções ainda são bem comuns na Bolívia rural. Nossos resultados sugerem que a redução das infecções, por si só, não pode explicar a diminuição de temperatura”, explica Gurven.

Mas os avanços na saúde não devem ser descartados: pode ser que, por estar mais saudável, nosso corpo hoje precise trabalhar menos para lutar contra infecções. A ampliação do acesso a antibióticos e outros remédios também pode representar uma diminuição na duração das doenças. Há ainda a possibilidade de que nosso organismo necessite mais se ajustar a variações de temperatura no inverno e verão, graças a tecnologias como ar-condicionado e calefação, ou simplesmente cobertores.

“É provavelmente uma combinação de fatores — todos apontando para a melhoria das condições”, disse Gurven. Os pesquisadores, entretanto, ficaram surpresos ao não conseguirem identificar uma única explicação para a redução na temperatura do corpo.

Por mais curiosa que seja a confirmação de que nossa temperatura corporal está de fato diminuindo, na prática pouco muda. Embora continue sendo um sinal vital e indicador do que está acontecendo no organismo, e apesar da fixação com os 37ºC, a maioria dos médicos reconhece que temperaturas “normais” têm um intervalo e podem variar ao longo do dia, indo de valores baixos de manhã cedo, a mais altos no fim da tarde. Também pode mudar de acordo com o ciclo menstrual, prática de atividade física e tende a diminuir com a idade.

Mas, ao sugerir uma relação direta entre melhorias gerais nos determinantes de saúde e mudanças na temperatura corporal, o estudo da equipe da UCSB pode ajudar a medir a saúde da população como um todo, assim como funcionam outros parâmetros usados atualmente, como expectativa de vida. “A temperatura corporal é algo simples de ser medido, então poderia facilmente ser acrescentada a pesquisas de larga escala que monitoram a saúde da população”, concluiu o autor do estudo.

Foto: Matteo Fusco/Unsplash