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Oftalmologia: um nicho visado por todos – das grandes empresas às healthtechs

Nos últimos anos, a oftalmologia esteve no centro de uma grande movimentação no setor de saúde. Do lado das gigantes, a especialidade passou a ser vista como um produto importante para se ter em carteira. Do lado das startups, a visão das possibilidades tecnológicas para melhorar o cuidado dentro e fora dos consultórios

Por Futuro da Saúde

Se você nunca teve algum problema ligado à visão, provavelmente um dia vai ter. Essa é a percepção da Organização Mundial da Saúde (OMS): 100% das pessoas terão algum problema nos olhos durante a vida. Sobre os brasileiros, o alerta da oftalmologia é ainda mais importante: até 2050, pelo menos 50% da nossa população será miope.

Esses números decorrem, principalmente, pelo envelhecimento e mudanças de hábitos da população. Hoje, 90% das pessoas sofrem de cansaço visual digital e 34% sequer já se consultaram com um oftalmologista ao longo da vida.

Além de dados como esses acima, que reforçam a importância de cuidar da saúde dos olhos, existem outros pontos que colocam a oftalmologia como uma das especialidades médicas mais atrativas para o mercado: ela abrange praticamente todas as idades, qualquer gênero e, em geral, requer a necessidade de exames periódicos – mesmo para quem não tem problemas relacionados à visão.

Nos últimos anos, a oftalmologia esteve no centro de uma grande movimentação no setor de saúde – seja nas grandes empresas ou nas healthtechs. Do lado das gigantes, oftalmologia passou a ser vista como um produto importante para se ter em carteira, dado o tamanho potencial de investimento e avanços que a especialidade pode gerar. Do lado das startups, a visão de agregar possibilidades tecnológicas para melhorar o cuidado dentro e fora dos consultórios.

“A oftalmologia se tornou uma área capaz de atrair muito investimento nos últimos anos. Ao lado das áreas de diagnóstico por imagem e oncologia, esse segmento concentra elevados montantes na busca pelo controle de parcelas significativas de mercado”, avalia Pedro Carricondo, do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

Movimentações recentes
No final do ano passado, o fundo de private equity da XP fez a maior fusão do setor ao comprar o CBV, hospital de referência de Brasília, no Distrito Federal. Isso possibilitou uma expansão que dominou o mercado oftalmológico para além do eixo Sul-Sudeste, tornando o player dominante em cidades como Recife, Cuiabá e Teresina.

Recentemente, foi anunciada pelo grupo a aquisição do H.Olhos, segunda maior rede de São Paulo no setor. A fusão foi batizada de Vision One e os planos são qualificá-la para um IPO com o objetivo de lançá-la na Bolsa de Valores em médio prazo.

Movimento parecido com o da XP foi feito pela Pátria Investimentos há seis anos, o que a consolidou como o maior grupo de atendimento oftalmológico da América Latina sob o comando do Opty. Já são 21 empresas, mais de 2,1 mil colaboradores e 750 médicos atuando no Sul, Sudeste e Nordeste brasileiro.

De acordo com o médico oftalmologista Paulo Schor, esse movimento de criar uma homogeneização e garantir uma melhor administração e controle de gastos ocorre desde meados das décadas de 1980 e 1990, com grupos consolidados de convênio. Um exemplo é a Amico, que atuava com protocolos definidos e equipe reduzida.

Toda a estratégia, porém, apesar de promissora, esbarrava na restrição de alcance por falta da capilaridade oferecida por grupos maiores, que atendiam milhares de pessoas. Agora, isso pode ser diferente. Com a entrada de players do mercado financeiro, o que se espera é exatamente uma escalabilidade dentro da cadeia produtiva.

“O objetivo desses grupos é multiplicar os números. E aí começa a fazer sentido comprar várias clínicas e utilizar essa lógica da organização, controle e protocolos em vários locais para que você tenha um resultado mais previsível e com faturamento maior a ser apresentado aos acionistas”, explica Schor.

“É uma importante mudança de paradigma na área, especialmente para os profissionais, acostumados ao trabalho como autônomos, que precisarão migrar para uma nova relação de trabalho como empregados destes grupos”, acrescenta Pedro Carricondo, do Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

Integração e jornada
À parte do interesse dos bancos e investidores, a especialidade está no radar do próprio setor de saúde. O grupo Fleury, referência em medicina diagnóstica, adquiriu a Clínica de Olhos Dr. Moacir Cunha há pouco tempo, movimento reforça que a empresa tem investido cada vez mais na prevenção e jornada do paciente.

“A oftalmologia tem evoluído de forma impressionante com equipamentos, tecnologias, fazendo cirurgia mais rápidas, mais seguras e de mais fácil recuperação. A de catarata, há 10 anos, tinha que internar, passar dias no hospital. Hoje você já sai enxergando. Foi uma transformação muito rápida”, explica Diego Penna, diretor de Crescimento e Novos Negócios do Grupo Fleury.

Segundo ele, o foco da empresa está em patologias conectadas a outras doenças. “A saúde está cada vez mais integrada. Quando a gente pega a oftalmologia, temos doenças da retina, glaucoma, que estão associados a diabetes, pressão alta, cardiopatias. Olhamos para essas e outras especialidades como uma jornada integrada. É importante fazer essas conexões”, completa Penna.

De acordo com ele, a oftalmologia foi o primeiro avanço do grupo neste sentido porque a especialidade está “bem relacionada” com o modelo de atendimento do Fleury. E outros investimentos no setor ainda devem ser anunciados ao longo do ano, para além da Clínica de Olhos Dr. Moacir Cunha.

Acesso às consultas
Nesse cenário em ebulição, as healthtechs de oftalmologia encontram espaço para propor soluções práticas que saem do atendimento convencional para um formato além do consultório. Para isso, a maior aliada é a tecnologia.

“O mercado da oftalmologia está em voga nos últimos anos, principalmente com o setor de ativos físicos tentando ser consolidado por dois grandes players, embora juntos ainda não tenham 15% do mercado. Neste contexto, temos a grande oportunidade de fomentar e realizar a consolidação digital, empoderando clínicas dos mais variados portes, sem estas fazerem parte de nenhum desses grandes grupos”, avalia Ariadne Porto, COO e cofundadora da Eyecare, uma plataforma de saúde visual digital.

A empresa atua em duas frentes: com produtos totalmente digitais que empoderam médicos oftalmologistas e pacientes; e outra que leva o cuidado oftalmológico e digital para empresas e operadoras de saúde.

A Eyecare está presente em 13 estados. Segundo Ariadne, são mais de 600 mil pacientes na base de dados e mais de 150 médicos oftalmologistas parceiros – além de médias e grandes empresas no portfólio de clientes, e parcerias estratégicas com expressivos componentes desse setor.

Tecnologia para expandir o acesso
Assim como em outras especialidades, hoje já não é mais possível falar de medicina sem falar também de inovações tecnológicas. Na oftalmologia, o uso dela é intensivo quando se fala de equipamentos e novos tratamentos medicamentosos e cirúrgicos.

No Brasil, a Phelcom surgiu em 2017 como uma startup, com a proposta de criar equipamentos oftalmológicos inovadores unindo conhecimentos em física, eletrônica e computação. Hoje, a empresa já se aproxima de uma indústria inovadora.

Ela é a criadora do retinógrafo portátil Eyer, equipamento que realiza a captura de imagens da retina, região sensível do fundo do olho, com o propósito de diagnóstico de diversas doenças. Dentre seus diferenciais, o aparelho faz os exames sem a necessidade do colírio para dilatação da pupila – o que permite seu uso de uma forma muito mais ampla e simples.

Além disso, o Eyer utiliza um smartphone integrado. “Isso traz algumas vantagens que vão desde o uso das melhores câmeras disponíveis no mercado com alta qualidade na exibição de imagem e, principalmente, a conectividade com a internet que habilita a telemedicina de forma nativa”, explica Flávio Pascoal, fundador e diretor de operações da empresa.

“O amplo uso de tecnologia na prática médica pode parecer a princípio um paradoxo, mas na realidade é um viabilizador para que o médico tenha uma atuação mais humanizada valorizando o paciente”, completa. Uma das vantagens do Eyer está na velocidade do exame, que se reflete em mais tempo para que o médico possa conversar com o paciente no consultório.

Serviço totalmente online
Comodidade, precisão e preço acessível. Esses são pontos essenciais para a operação da Lenscope, healthtech pioneira na venda de lentes para óculos pela internet. Com uma jornada 100% digital, a empresa utiliza inteligência artificial para oferecer produtos, de forma mais acessível e cômoda ao consumidor.

A empresa retira a armação do óculos em casa, a depender do endereço do consumidor, e mede a DPN (distância entre as pupilas) a partir de uma foto. Caso o cliente não se adapte em até 100 dias, a Lenscope se compromete a devolver o dinheiro investido nas lentes.

“A ideia surgiu quando observamos que as lentes eram a parte mais cara e menos acessível da correção da visão. Mais cara porque é a maior fatia do que se gasta com saúde visual. E é mais inacessível porque é difícil entender a oferta de produtos para fazer a melhor escolha”, explica Makoto Ikegame, fundador e CEO da empresa.

De acordo com um levantamento feito pela empresa, somente as lentes para óculos representam algo entre 50% e 70% dos gastos anuais que alguém que usa óculos tem com saúde dos olhos.

“Em nosso caso, acreditamos que aplicar tecnologias como visão computacional e aprendizado de máquina têm a capacidade de tornar um par de óculos acessível a mais pessoas, removendo intermediários e, consequentemente, chegando a preços mais justos”, completa Makoto.

“Somente no Brasil, quase 130 milhões de pessoas precisam de algum tipo de correção visual – seja para miopia, hipermetropia, astigmatismo ou presbiopia. Trata-se da maioria da população. Ainda assim, adquirir um par de óculos é um processo demorado, lento e caro”, finaliza.

Futuro da oftalmologia
O setor de saúde passa por um momento em que o foco está voltado para a prevenção. Então, na área de oftalmologia essa tendência deve seguir. “Os estudos mostram que o investimento em prevenção é muito mais eficiente economicamente do que as ações de tratamento”, diz Flávio Pascoal, da Phelcom. Ele ainda destaca que, com uma população cada vez mais longeva, sedentária e com maus hábitos alimentares, aumenta-se a demanda do sistema de saúde tornando uma terra muito fértil para iniciativas que contemplem essas questões.

Para Ariadne Porto, da Eyecare, as perspectivas são promissoras. Segundo ela, os dados epidemiológicos que mostram aumento substancial nas demandas por cuidado nessa especialidade demonstram justamente a necessidade de investimento no setor. “Da mesma forma que a saúde mental foi valorizada nos últimos anos, o cuidado com a saúde ocular será nos próximos, justamente pelo aumento da prevalência destes problemas e impacto negativo caso não seja devidamente cuidado”, sinaliza Porto.

O paciente deverá ser o mais impactado por essas mudanças. Para Paulo Schor, essa movimentação na oftalmologia vai possibilitar que eles tenham acesso a equipamentos de saúde que antes eram menos utilizados. “Você tinha ótimas clínicas que eram menos utilizadas, tanto por ociosidade quanto por falta de protocolos. Agora, mais gente vai ser atendida e por melhores equipamentos.”

Pedro Carricondo, do CBO, complementa. “Para o paciente, o principal benefício é a centralização, com acesso às diversas sub-especialidades, exames e tratamentos facilitado por conta disso. Mas ainda não se tem claro quais as consequências disso no contexto de capilaridade do atendimento.”

Foto: Futuro da Saúde